Novo CD do Ultraje A Rigor mostra a fórmula da surf music
Surf music por surf music, de forma geral, tem fama de ser coisa chata. Muitas incursões de bandas novatas pelo gênero popularizado por Dick Dale, Beach Boys, Jan & Dean e outros têm sido dignas de campeonato de futebol de botão, ou de Clube dos Amigos do Monza: música para meia dúzia de iniciados, e que acaba não fazendo sucesso. Mesmo bandas legais como Os Ostras passaram por isso: lançaram um disco legal, outro mediano, mas não atingiram as paradas nem mesmo fazendo um som que estava de acordo com o que fazia sucesso na época – rock animado e adolescente com letras gozadoras e alguns palavrões. E provavelmente a banda devia amar o Ultraje A Rigor, grupo que vem abraçando o rock explícito, sacana e com espírito juvenil há mais de vinte anos.
O novo CD do grupo, “Os invisíveis”, vem ao mundo para mostrar que a velha máxima marxista, de que a história só se repete como farsa, dá certo, e como: Roger sempre fez um som ligado a temas praianos, ao deboche, ao sarcasmo, à inocência do rock dos anos 50/60 (épocas que ele, por sinal, viveu) e sempre teve influência de surf music – é só ouvir o ska pesado de “Nós vamos invadir sua praia”, as guitarras de “Eu me amo” (ambas de 1985) e o solinho de uma nota só de “Pelado” (de 1987), além de discos como “Crescendo” (1989) e “Porque Ultraje A Rigor?” (1990), que só provam que a relação da banda com as ondas não vem de agora. Portanto, a iniciativa da banda em mexer na corneada, estuprada e sacaneada surf-music está longe do farsesco. Solidificada a relação com o baixista Mingau e ainda com a presença do fâ Bacalhau (ex-Rumbora) na batera, o clima do disco é de “de volta à praia”, ainda mais com o retorno do guitarrista Sérgio Serra – por sinal o autor do tal solo de uma só nota. Não por acaso, a capa do disco novo remete logo à de “Nós vamos invadir sua praia”, primeiro LP: tem mar – uma onda, no caso do novo CD -, tons de azul, e a banda posando na praia na contra-capa, só que dessa vez sem farofa, sem vitrolinha e acompanhada de um Gordini.
Em meia hora de duração, o recauchutado Ultraje mostra que só quer mesmo é fazer rock, e pronto. Mesmo que falte à banda a vontade de mover montanhas que os primeiros discos tinham, o som do Ultraje continua com tudo no lugar, conforme atestam as boas “Domingo eu vou pra praia”, “I m sorry” e “Todo mundo gosta de mim” (um rock-rap lembrando “Sexo!”). Tem umas bobeirinhas, claro (“Esta canção”, “Me dá”, etc), mas graças a Deus são poucas. Roger já merecia o prêmio de “homem de visão do ano” por se conscientizar de que tem 45 anos e não querer posar de garotão – atitude que acaba gerando canções como a boa “Agora é tarde” (uma espécie de “Epitáfio” dos Titâs, só que desencanado), a sessentista “Me dá um olá” e a instrumental “O velho surfista” – e é nessa linha que rola o CD, do início ao fim. Um disco que dá pra agradar adolescentes, idosos, crianças, velhos surfistas e rockeiros velhos.