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Crítica: “Bocas ordinárias” é o melhor CD do Charlie Brown

Depois que a gente passa dos 25 e chega na fase dos “quase 30″, normal ser acometido por ataques de moralismo e passar a achar babacas versos como “quero que se foda essa merda de sociedade/pago minhas contas, sou limpinho/não sou como você filho da puta viadinho” – que estão no meio de “Papo reto”, mais novo hit do Charlie Brown Jr. Isso sem contar que Chorão, que provavelmente deve ter como modelo Mike Muir (do Suicidal Tendencies), está cada vez mais parecido com o Tchutchucão, aquele cachorrão boa praça e desajeitado do programa da Xuxa. Mas dê um desconto: Bocas ordinárias é o melhor CD do Charlie Brown. O quarteto resolveu falar grosso e impôs a seu quinto disco um sonzão, marcado por guitarras pesadíssimas e muito bem elaboradas. Dá até pra esquecer as bobeiras que foram os dois últimos discos da banda.


A praia (sem trocadilho) do CBJr. é a fusão punkmetalhardcore com influências de música para embalar aventuras a bordo de um skate ou de uma prancha de surf – nessa receita, entram o Suicidal Tendencies, Concrete Blonde, Beastie Boys, Iggy Pop fase Instinct, etc. Se fosse lançado nos anos 80, o Charlie Brown seria uma banda cultuada, ouvida por milhares de surfistas e skatistas, e provavelmente nem passaria na porta das grandes gravadoras. Lançados nos anos 90, os quatro unem boas pitadas de grunge e rap ao seu som. Mesmo gravando uma versão punk da Legião Urbana (“Baader Meinhof Blues”, que a banda já havia tocado num Luau MTV), o que fica na memória são as porradas, solos, slaps e riffaramas de “Papo reto” (uma puta canção pop, por sinal), “Só por uma noite”, “Sou quem eu sou” e “Tarja preta”, entre outras. Os caras capricham em hardcores agitadaços e pesadíssimos (como “My mini ramp”), fazem uma homenagem ao rap inspirada no Rage Against (“Somos poucos mas somos loucos”) e detonam na berraria de “Com a boca amargando”, com toques de Soundgarden. Diga-se de passagem, no disco não tem nada parecido com “Não é sério” ou “Lugar ao sol”. Graças a Deus.


Fica difícil eleger um membro da banda como o melhor instrumentista, mas o esforço de Marcão é notável: sem a segunda guitarra de Thiago (que saiu da banda após o terceiro disco), ele se desdobra em dez para preencher todos os canais disponíveis com imensas guitarradas – vale destacar as palhetadas de “Com minha loucura faço meu dinheiro, com meu dinheiro faço minhas loucuras”. O desempenho de Chapingnon também está acima da crítica em faixas como “Tarja preta”, cheia de slaps. Possesso, Chorão atua praticamente sozinho no clube dos gritadores do mainstream brazuca, é um berrador afinado e criativo e detém boa parte do carisma do CD. Só que o excesso de letras infantis, papo “encontrei a paz” e versos no estilo espinhudo-teen-playba-revolta-de-butique cansam, sinceramente. Em “Não fure os olhos da verdade”, um “ser punk não é isso, é muito mais que isso” chega a dar vontade de rir. Sem contar o verso “tipo assim out side, tipo assim meio pop/eu tô cagando pra essa porra de Ibope”. Tá bom, meu filho. Manda o disco de ouro aqui pra casa, então.

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