Conheça as bandas de congo que tocaram no Dia D 2001
Designado, por ocasião do Dia D, para trazer aos leitores do MúsicaNews informações sobre o congo, estilo musical enraizado na cultura do estado do Espírito Santo, conversei durante a semana passada com integrantes das bandas do gênero que se apresentaram no festival. Agora, apresento abaixo o histórico dos grupos, resultado das conversas que tive com seus integrantes.
Banda de Congo Mestre Alcides
A Banda de Congo Mestre Alcides é formada por remanescentes da Banda de Congo da Barra do Jucú, ou seja, os mais antigos conguistas, seus filhos e netos, que após desentendimentos, resolveram formar uma nova banda. Na verdade a primeira banda existente na Barra do Jucú foi trazida por Mestre Alcides quando ainda rapaz, vindo de Jaguaruçu (um lugarejo próximo) para aqui fixar moradia. Hoje seu filho é o mestre da banda, respeitando a hierarquia que passa o título de “mestre” de pai para filho.
Entre algumas crises e sentindo a necessidade de resgatar este velho sonho, após o falecimento de Mestre Alcides em 1991, alguns “barrenses” se mobilizaram com fins a restaurar a banda com os conguistas mais antigos que já haviam tocado na Barra do Jucú. Alguns dos ilustres componentes já se foram (Sr. Aroldo Vieira, D. Elza, Leonora, Sr. Honório, Sr. Eustácio); dos mais antigos que ainda permanecem, estão: José Silva, José Luís, João Amaral, Antônio Beju e Paulo Nunes. A banda conta ainda com os mais jovens, resultado de um trabalho iniciado em 1987, com a primeira Banda de Congo Mirim criada no município de Vitória e Vila Velha.
A Mestre Alcides já participou de vários eventos nacionais e internacionais, representando o estado e a Região Sudeste, porém luta até hoje por uma sede própria e por reconhecimento do Município de Vila Velha como referência da tradição cultural e popular do folclore espírito santense.
Banda de Congo Mirim da Ilha
Tudo partiu do projeto “O Congo na Escola”, criação do músico Fábio Carvalho (percussionista do Manimal), coordenado também por ele e pela produtora cultural Alcione Dias. Com o apoio inicial da Lei Rubem Braga e supervisão do Mestre Zé Bento da Banda de Congo de Nova Almeida, a dupla criou a Banda de Congo Mirim da Ilha, que reúne 30 crianças de 4 a 13 anos da região da Grande São Pedro. Os ensaios acontecem uma ou duas vezes por semana na Escola Francisco Lacerda de Aguiar, na Ilha das Caieiras, onde a maioria dos conguistas do futuro estuda.
A Banda de Congo Mirim da Ilha tem o patrocínio da Fundação Vale do Rio Doce. Além disso, conta com a parceria da Prefeitura Municipal de Vitória, através das Secretarias de Educação e Saúde, que levam às crianças recebem apoio pedagógico, médico e odontológico. A meninada já se apresentou na Feira do Verde, em seminários de folclore e encarou um público de 20 mil pessoas na abertura do show do Big Beatles, na Praia de Camburi. Há pouco tempo foram a São Paulo, sendo a primeira viagem do grupo para uma apresentação noutro estado.
Os participantes recebem informações teóricas sobre a história, ritmo e melodia do Congo no Espírito Santo, suas formas musicais e a fabricação artesanal de seus instrumentos. Como atividade prática, o projeto oferece a formação de bandas de congo mirins.
Casaca
Banda que tem se popularizado de uma forma absurda, sendo um dos maiores destaque no circuito musical capixaba atual, o Casaca mostra que não é somente mais um grupo que tenta o sucesso. Com 1 ano e 6 meses de atividades, um disco lançado – No Tambor, Na Casaca, Na Guitarra – várias apresentações dentro e fora do Espírito Santo, e até fã-clube, Renato Casanova (vocal), Vinícius Gáudio (casaca e tambor de repique), Márcio Xavier (baixo e voz), Jura Fernandes (guitarra e voz), Thiago Grilo (caixa e tambor de repique), Flavinho (tambor de repique), Periquito (caixa e casaca) e Jean Márcio (tambor de condução) trazem uma proposta sonora onde a fusão do pop-rock com o reggae e o congo, o elemento principal dessa salada rítmica, definem o que a rapaziada toca.
Vários fatores convergiram para o agrupamento dos músicos: o principal é o envolvimento dos músicos com as bandas de congo da Barra do Jucú, em Vila Velha. “A maioria do pessoal participou da Banda Mirim (da Barra); eu só não entrei porque quando eu me mudei prá lá já estava meio grandinho” conta Márcio. A idéia também não é tão nova: o artista plástico Cléber Galveias, morador da Barra e um dos responsáveis pela reestruturação da Banda de Congo Mestre Alcides, sugeriu a fusão de música pop com o congo barrense há cerca de cinco anos, e daí surgiu o Kalangocongo.
Um problema: o Kalangocongo tinha uma sonoridade mais para forró do que prá congo. “Se você colocar triângulo e acordeão no congo, ele fica meio nordestino”, observa Jura. Junto a isso, os interesses divergiam e alguns componentes que futuramente formariam o Casaca abriram mão do Kalango, partindo para projetos pessoais.
Esse reencontro entre os que saíram e outros músicos da Barra aconteceu final de 1999, quando houve o convite para fazerem um show no Revéillon. Sem triângulo e “os sonzinhos esquisitos de sanfona no teclado”, o grupo preparou algumas músicas mas o resultado final ainda não era satisfatório; problema resolvido no dia da apresentação. “Na hora de tocarmos, o baterista não apareceu e a gente tinha que tocar. Aí encontramos a nossa identidade, o DNA da banda. Quando descemos do palco, todo mundo veio elogiar. Depois o batera apareceu perguntando ‘quando a nossa banda vai tocar’, e a gente respondeu: ‘nossa banda não tem bateria’”, conta Márcio, Jura e Thiago em meio a risadas.
Desde então existe o Casaca e os músicos são os mesmos. E cada vez mais unidos. “Isso que é legal na banda, quando a gente tem um problema, todo mudo senta e para prá discutir – como a gente vai resolver isso?” Um desses momentos foi quando a banda passou por um roubo à mão armada e os assaltantes levaram alguns instrumentos, fato que atrasou a gravação do CD, pois parte da verba destinada para tal teve de ser usada na reposição do que fora levado.
Apesar desse problema, a gravação correu muito bem. No estúdio onde trabalharam durante dois meses, o dono e guitarrista Walton Jacaré deu bastante liberdade ao grupo. Começando pela timbragem dos tambores (que levou uma semana – e não foi cobrada por Jacaré) até a adaptação ao ambiente – por exemplo: boa parte dos músicos não sabia nem o que era um metrônomo. “Nunca tinha visto um na minha vida”, lembra Thiago.
O resto não é novidade: o Casaca lançou seu CD final de abril, já tendo vendido quase 9.000 cópias dele. O disco chegou até a aparecer em 17º em vendas no Espírito Santo, segundo a revista especializada Sucesso CD. Músicas como Sereia e Ondas do Barrão (a mais famosa no momento) já fazem parte da programação de várias rádios. Sobre esta última, há até uma história: “enquanto fazíamos um show havia um casal brigando alto, mas de fazer escândalo e todo mundo ouvir. O cara participava de um campeonato de surf ou body (boarding) e a garota reclamava alguma coisa disso. Cheguei em casa, peguei o violão e resolvi escrever algo sobre isso. Depois eu a cantei no show seguinte, mas a maioria dos músicos não conheciam. Comecei pelo coro, todo mundo cantou junto e a música tomou esta proporção”, narra Renato.
Mesmo com a quantidade dos compromissos aumentando gradativamente, eles não tem se deixado levar por isso. De vez em sempre eles tocam na Barra e também assumiram há pouco tempo uma Oficina de Congo no Deares, para alunos de escolas públicas de Terra Vermelha, Viana e Cariacica, onde será dada a oportunidade das crianças criarem vínculo com a percussão e com a cultura não só local, mas nacional.
Manimal
Banda capixaba de maior popularidade dentro e fora do estado, o Manimal está a quase seis anos no mercado, com dois CDs, vários prêmios, algumas tournées internacionais, diversos elogios e muita história prá contar.
A história do Manimal começa muito antes, em 1986 com o envolvimento dos irmãos Alexandre e Amaro Lima e sua antiga banda (Combatentes da Cidade) com a Banda Parafolclórica, chegando a fazer uma apresentação no Teatro Carlos Gomes. Pluralidade musical nunca foi novidade para Alex e Amaro que, por serem filhos de um executivo da Sony Music, consumiam todo o tipo de música. Mas estava claro que o Espirito Santo possuía uma cultura local a ser explorada.
Entre idas, vindas e mudanças, Alexandre, Amaro, Queirós (que já tocava bateria com Alex), Fábio Carvalho, Frederico Nicolai (Nick) e Ronaldo Rosnan se juntaram para formar o Manimal, tendo como proposta a fusão do pop-rock com o congo original da terra, estilo definido hoje por “Rockongo”. Alexandre, que estava ligado ao pessoal da Barra do Jucú, e Fábio, que sempre estudou a cultura local, tendo laços estreitos com os grupos de congo da Serra, definiram a proposta do grupo junto aos outros componentes, a ponto de construírem um tambor de rockongo, adaptação do tambor de congo original, porém maior para se adquirir um som de maior projeção e punch.
A partir daí, a banda partiu para a estrada, ganhando alguns destaques e prêmios por onde passou. O primeiro deles foi um concurso de jingles que possibilitou aos rapazes gravarem o seu primeiro registro fonográfico. Logo após, em junho de 96, foi a vez de ganhar o prêmio de melhor arranjo no Festival Nacional de música em Alegre dentre 360 músicas inscritas, onde o Manimal mostrou o Rockongo pela primeira vez para um grande público (aproximadamente 20.000 pessoas). Em Agosto de 96, a Radio Internationale de Paris (RF1) aponta o Rockongo, entre trabalhos de 440 bandas de todo o mundo, como um dos 8 melhores trabalhos da América Latina e Caribe, garantindo assim uma faixa no CD “Les Decouvertes 96 de RF1″ distribuído em toda a Europa.
Em abril de 1997, eles lançam o primeiro CD que leva o nome da banda. Mais prêmios e convites aparecem, inclusive o da Expo 98, em Lisboa. E o que deveria ser uma pequena apresentação só para marcar a viagem, virou 3 shows com recorde de público e uma tournée por Portugal, Espanha, França e Bélgica. “a gente recebeu uma graninha boa por esses shows. Deu prá bancar mais de um mês viajando e tocando pela Europa. Eu só tinha 50 dólares, era dinheiro só para chegar lá, receber o prêmio e voltar; eu tava duraço”, conta Alexandre.
Em 21 de outubro de 2000, a banda lançou seu segundo CD (Tow Tow), com um som mais eletrônico se comparado ao trabalho de estréia. Esse conceito de “Modernidade com Cultura Popular” onde entra congo, guitarras, teclados e samplers reflete uma evolução e amadurecimento musical no processo de consolidação da identidade do grupo.
Hoje o Manimal é formado por Alexandre Lima (Vocal/Guitarra), Amaro Lima (Vocal/Baixo), Queiroz (Bateria), Fábio Carvalho (Vocal/Percussão) e Ronaldo Rosman (Vocal/Percussão). Também contam com o auxílio de Léo Caetano (2a Guitarra/Teclado/Samplers) e Fernando Farinha (Percussão).