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Jorge Ben: “eu quero fazer sempre coisas pra frente”


       Os filhos de Jorge Ben Jor tiveram trabalho. Levaram três anos para convencer o pai a gravar o Acústico MTV. Mas valeu a espera. O novo trabalho do músico chega às lojas neste sábado. Serão três discos: um deles, com a banda Admiral Jorge V, que acompanhou Ben Jor no início da carreira; outro, com a Banda do Zé Pretinho; e um terceiro, duplo, reunindo todo o trabalho. As duas partes do especial gravado pela MTV serão exibidas separadamente, na sexta-feira e no sábado, às 22h. Antes da coletiva de Jorge Ben em São Paulo, a emissora mostrou os melhores momentos do DVD, que também estará nas lojas neste final de semana. Logo no início – apesar da demora de mais de duas horas para o começo da exibição – era possível notar um pé batendo aqui, um ombro chacoalhando acolá. Mas, ao som de Taj Mahal, já era difícil encontrar quem tivesse resistido ao “rei do ritmo”, como já definiu Paulo Miklos, dos Titãs. Na entrevista, Jorge falou da carreira, dos seus discos que acredita que estavam à frente de seu tempo, das gravações do Acústico e da participação dos músicos. E reclamou de várias coisas, inclusive da gravadora que relançou alguns de seus discos sem comunicá-lo. Além disso, Ben Jor garante que tem projetos até 2035. Salve, Jorge!


Você há muito tempo não tocava violão. Como foi retomar o instrumento?
A vida toda eu toquei violão. Eu comecei tocando violão. Nos discos que eu gravei com o Admiral eu tocava. Teve o “Solta o Pavão” [1975], o “África Brasil” [1976]. Foram discos totalmente acústicos. Minha primeira gravação tocando guitarra foi no primeiro disco que eu gravei na Jovem Guarda, que foi com o conjunto de rock “The Fevers”. Eu gostei do contato com a guitarra. Acho que, pra tocar do jeito que eu toco, com uma banda que é pesada como a Banda do Zé Pretinho, que toca muito forte – forte, mas educadamente, dentro do ritmo -, eu tenho de ter uma guitarra cantante pra poder acompanhar.


No show, há inclusive um solo seu no violão.
Eu me senti bem tocando o violão. Tive de fazer umas experiências novamente. Foram duas semanas com um violão de 12 cordas de aço, que eu não tocava há muito tempo, e fez uma diferença boa. O solo, pra mim, foi bom. Deu pra suingar!


Por que a opção pelo violão de cordas de aço?
Foi uma maneira de mudar o Acústico. E quando eu fui convidado para fazer, fiquei pensando muito tempo. Levei três anos para aceitar gravar. Eu queria fazer, mas tinha de fazer soar diferente dos outros e eu já tinha visto que todo mundo fez o Acústico com violão de nylon ou com violão de aço, mas com seis cordas. Eu quis fazer com um de doze pra mudar o som. Foi isso que aconteceu. Mudou o som do Acústico. Embora o violão tenha sido plugado, ele foi trabalhado com microfones do lado. O violão de doze cordas é diferente da qualidade do que você tem no violão de cordas de nylon, que é mais suave. Foi pra ficar forte no palco, pra banda sentir.


Qual foi o argumento que o fez aceitar a gravar o Acústico?
Realmente, eu não queria gravar. Foi contrato da gravadora. Eu nunca quis fazer. Eu achava que, modéstia à parte, tenho muita coisa nova pra mostrar. Muita coisa à frente. Eu vivo a minha vida musical toda estudando ritmos, melodias, coisas muito à frente que às vezes não estão pra serem mostradas na época atual. Mesmo assim, eu quero fazer sempre coisas pra frente, pra frente… E meus primeiros discos eram acústicos, pô! Mas aí, os meus filhos ajudaram a me convencer. Eles pediam, achavam bonito, diziam que era bom fazer. Os amigos deles tinham assistido a outros Acústicos e gostavam. Meus filhos têm 17 e 18 anos. Aí, eu gravei e, realmente, fiquei contente. Consegui reunir minha primeira banda, que foi a Admiral Jorge V, que sempre trabalhou comigo, e mais a minha banda atual, a Banda do Zé Pretinho, que é a alegria do meu coração.


O que achou do resultado?
A gente queria fazer uma Acústico diferente. Todo mundo já gravou Acústico. Queria que soasse gostoso. Não queria fazer um show de aposentado. Quando me chamaram pra ouvir, eu tive várias surpresas. Acho que ficou bonito, bem diferente.


Como foi a escolha dos músicos para o acompanharem na gravação?
No Acústico, eu toquei com quem eu já trabalhei. Eu consegui reunir um trio que teve uma participação muito grande no vocal, junto comigo, que foram os Golden Boys. Eles também estão no “África Brasil” e em outros discos meus. E o produtor também, o Paulinho Tapajós, que é muito amigo meu.


Você pensou em alguém em especial para participar da gravação?
Não. Eu só pensei em chamar o produtor. O Acústico foi um disco que não estava nos meus planos.


Como foi gravar com um conjunto de cordas?
No meus discos ao vivo e acústicos não há conjuntos de cordas. Então, pra ficar diferente, nós chamamos um naipe muito bom. Ficou legal. Eu sempre gostei dessa diversidade de sons. Eu sempre misturei tudo. Na Banda do Zé Pretinho, eu pedia pra misturar tamborim, cuíca, tambor, ganzá, guitarra, violão.


É verdade que você e as bandas ensaiaram juntos por pouquíssimo tempo?
Realmente, foi muito pouco ensaio. Nós não chegamos a ensaiar nem uma semana direto. Acho que foram menos de quatro dias. O único ensaio geral foi no dia da gravação. Foi a única vez que eu consegui tocar com a metaleira e com os violinos. O tempo foi pouco porque demorou pra reunir todo mundo. No Admiral, estava todo mundo separado, longe. O Dadi estava tocando com a Marisa Monte e o Gustavo com o Zé Ramalho. O João, pianista, virou fazendeiro em Governador Valadares, tocando só de vez em quando. O João Zim, da percussão, estava em Juiz de Fora. Então, foi complicado reunir todo o pessoal. E não tivemos tempo de ensaiar. Eu disse a eles: “vamos tentar não errar, mas, se acontecer, errar legal”.


Como foi pra reunir os músicos?
Hoje, todo mundo tem e-mail, né? Mandei: “apareçam por favor”. O meu produtor foi quem convidou todo mundo. O único que eu convidei foi ele, o Paulinho Tapajós, que cuidou de reunir o pessoal.


Como foram as gravações do show?
Foram dois dias. Eu nunca fiz um show tão tenso, tão nervoso. Toda hora tinha de chamar alguém pra me dar uma toalhinha gelada. Nunca mais quero tocar assim. Juro, mesmo. As pessoas só fazem shows depois do disco pronto, dos ajustes. E esse foi o contrário. Fui pego de surpresa. Foi como eu já disse aqui. Reuni o pessoal e falei: “se errar, vamos errar bonitinho”. Mas eu gostei demais do resultado. Não ficou igual aos outros. Eu gostei da gravação. Só senti por não convidar músicos de outras bandas, que não puderam participar porque o convite não partiu de mim. Fico até encabulado. Produzo muita coisa e fico honrado quando os músicos me perguntam como eu fiz tal música, como eu usei tal acorde na cozinha, como eu pensei no vocal. Eu gostaria de ter feito o trabalho com mais gente. Com a rapaziada nova que está aí, como o Simoninha, filho do meu amigo [Wilson Simonal].


Como vê a presença de jovens nos seus shows?
Na minha geração – não a musical, mas o pessoal da época em que eu comecei -, ninguém entendeu o meu trabalho. Agora, mais de 60% da platéia dos meus shows é de adolescentes. Eles pedem para eu tocar “Os Alquimistas estão chegado”, por exemplo. É uma das mais pedidas. Essa música está no meu disco “A Tábua de Esmeralda” [1974]. Isso é muito bom. Eu me sinto honrado.


Que tipo de música você gosta de ouvir?
Eu não tenho um estilo preferido. Eu gosto de tudo. Todos os estilos, todos os ritmos, todas as letras de música. Eu, graças a Deus, acompanhei os movimentos. O primeiro de que eu participei, foi sozinho. Porque, quando eu lancei o meu primeiro disco “Samba esquema novo” [1963], os críticos da época não sabiam em que gênero me classificar. Eu dei as músicas para uma banda de jazz gravar. O pessoal do samba não entendeu o meu samba. Tanto que saiu com o nome de “Samba esquema novo”. Ou seja, uma coisa nova que ninguém entendia. Eu comecei sozinho esse movimento, depois eu fui para a Jovem Guarda. Em seguida, passei para o Tropicalismo. Toquei com os baianos. Com Gil, Caetano, Gal, Tom Zé. Logo depois, vieram os Mutantes. Foi um movimento muito bom, que deu várias crias, muitas músicas boas. Mas, dali pra frente, eu voltei a ficar sozinho. Eu queria fazer um som pro pessoal dançar e queria uma banda que pudesse tocar esse som. Eu consegui com a chegada da Banda do Zé Pretinho.


Na década de 90, você lançou poucos discos e eles não foram bem recebidos pelo público. O que deu errado?
Aquela fase, pra mim, não deu errado musicalmente. O “Homo Sapiens” [1995], por exemplo, é um disco pra agora. Há um outro que eu fiz com convidados, o “Música para tocar no elevador” [1997], que é um disco também muito bom. É maravilhoso. Mas eles saíram quando não eram pra sair.


Por que você optou por não gravar nenhuma inédita no Acústico?
Não foi opção minha. Quando a direção da Universal me mostrou como seria o projeto, eles tinham um arquivo meu com mais de quarenta músicas para eu escolher e no CD e no DVD. As únicas músicas que eu fiz questão de gravar foram “Os Alquimistas…” e “Take Easy my brother Charles”. Tinha até uma inédita, mas não ficou boa a gravação. E pra gravar, precisa ficar perfeitinha. Toda certinha.


Foi você quem optou por lançar dois CD’s simples e um duplo?
Não foi idéia minha. Mas eu me sinto gratificado. Pra mim, é uma honra. Três CD’s de uma vez só! Vai sair um CD com tudo e dois separados, cada um com uma banda, a Admiral e a Banda do Zé Pretinho. Eu achei legal.


Acredita que o Acústico poderá forçar o relançamento de seus discos antigos?
Isso já está acontecendo. Lançaram o primeiro, o terceiro ["Ben é samba bom", 1964] e o “África Brasil”.


Gostou da escolha dos títulos para serem relançados?
Eu gostei, mas não gostei muito. Porque, eu sendo o dono da obra, não me convidaram nem pra falar nada, pra dar uma “pala”. E eu gostaria de falar. Lançaram meu primeiro disco, meu primeiro trabalho. Eu gostaria de ter participado da decisão.


O “África Brasil” é considerado, atualmente, um ótimo disco. Mas não foi muito divulgado à época em que foi lançado pela primeira vez. Por quê?
Foi um disco que também saiu fora de época. Não teve nem repercussão. E foi uma época muito conturbada. O meu produtor era o Paulinho Tapajós que foi trocado pelo Mazzola, que produziu o disco seguinte ao “África Brasil”. O presidente da Polygram, na época, saiu da gravadora. Então, o disco ficou parado. Aí, eu aproveitei e saí também.


Vai estender o trabalho de divulgação e shows do Acústico por muito tempo?
Eu tenho propostas para fazer isso. Agora, não sei… Eu só gostaria de fazer shows como foi o Acústico, com as quarenta pessoas no palco, com direito a orquestra e meus convidados. Igualzinho está no DVD e no CD. Se eu for fazer, vou levar esse violão mesmo, já está lá, afinadinho.


Qual seu próximo projeto?
É um disco de músicas novas. Faz sete anos que estou guardando as inéditas, adiando a gravação. De vez em quando, coloco no show pra ver a reação da platéia. No ensaio, a gente toca e os músicos gostam. Eu já tenho material para um novo disco.


Como é chegar aos 60 anos com tanta vitalidade?
Estão falando aí, mas eu vou chegar. Eu quero dizer que o “Mais que Nada” [música que está no primeiro compacto, lançado em 1963, pouco antes do "Samba esquema novo"] vai fazer quarenta anos de música no mundo em 2006. E um certo Ben já me convidou pra gente fazer uma grande festa, porque o “Mais que Nada” foi o começo dele nos Estados Unidos, onde ele se lançou para o mundo tocando músicas totalmente em português. Então, o Ben e o Ben Jor vão fazer tudo junto, em 2006. Pra completar, sobre a Banda do Zé Pretinho, nós vamos tocar até 2035. Se Deus quiser. A família agradece. Salve Simpatia.



Mais Jorge Ben
CyberJorge: O site oficial de Ben Jor é bem básico: traz biografia, discografia, fotos, agenda (não atualizada) e cifras de algumas canções do músico.


RadioBen: Muito mais atualizado que o site oficial, o Radioben.net já traz informações sobre o disco Acústico e produz programa especiais com músicas antigas de Jorge, dentre outros conteúdos.

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