Entrevista: conscientização e diversão com a banda Umanoi
O grupo carioca Umanoi formou-se há quatro anos e acabou de lançar seu primeiro CD independente, Artigo negro. A banda tem em sua formação Clarence Merria (vocais), Fernando Aranha (guitarra) e Rodrgio Scofield (bateria), além de alguns músicos convidados, como os baixistas Bernardo Fonseca e Rodrigo Saci (homenageado na faixa “Saci (A lenda)”). A idéia principal do trio é trabalhar direto com groove: rock n roll, hip hop, funk, soul… Tudo escancarado direto no nome de seu CD e na capa do disco, que mostra uma criança de rua, daquelas que fazem malabarismo no sinal.
O Umanoi tem uma grande preocupação social, mas antes de tudo é uma banda de diversão, de festa – como eles próprios dizem, “a música tem o poder de despertar e entreter sem distinção de cor, credo ou classe social – todos têm o direito ao lazer e diversão”. Confira qual é a do Umanoi nessa entrevista abaixo, feita numa noite chuvosa no Baixo Gávea (Rio de Janeiro).
Central da Música: Como vocês definiriam o som da banda para quem ainda não conhece?
Fernando Aranha: Bom, o som da gente mistura principalmente hip-hop, funk, soul e rock n roll, faz parte do lema da banda… As influências que têm a ver pro cara que vai ter a referência são de Lenny Kravitz, Red Hot Chilli Peppers, O Rappa.
Central da música: Tem uma cara bem mais black do que rock, até. Eu senti uma influência bem grande de Banda Black Rio e tal.
Fernando Aranha: A gente tem uma influência muito grande disso, mas claro, trazido pra essa…
Rodrigo Scofield: … linguagem mais rock n roll.
Fernando Aranha: Para essa linguagem rock n roll, mais moderna.
Rodrigo Scofield: É mais a influência de todo mundo também, porque ele (Clarence) traz uma onda mais black, aí comigo tem um lance de ritmos brasileiros também. E a proposta do rock que a gente está desenvolvendo agora é de um rock moderno, de um rock que está rolando. E o Fernando também com a onda rock n roll, de Red Hot Chili Peppers, Lenny Kravitz. Na verdade mistura vários tipos de música, assim. Mas essa onda black vem muito pelo vocal, principalmente, o estilo de cantar mesmo, na onda do Lenny Kravitz, do Stevie Wonder, soul.
Central da Música: Como a banda se juntou?
Clarence Merria: Bom, a banda se juntou faz mais ou menos uns 4 anos, porque eu e o Fernando temos um amigo em comum, o João Miguel, que tocava com ele no trabalho de uma cantora, e o João Miguel tocava comigo numa banda de salsa. Eu tocava guitarra. O Fernando e o Rodrigo já se conheciam, e eles estavam atrás de um vocalista para formar um lance que eles já tinham começado. Um lance meio instrumental, que eles queriam colocar voz. Eles entraram em contato comigo, “pô, vamos levar um som”, vamos nessa. Cheguei no estúdio, era um lance muito doido, botei a voz numa parada muito louca… que era um jazz-fusion, uma parada muito quebrada, e eu me perdendo no vocal, assim… Mas eu gostei dos caras, da aura, do espírito dos caras…
Rodrigo Scofield: A vibração na hora, que rolou…
Clarence Merria: E eu nem gostei do som, porque vocal não rolava ali, era uma banda instrumental. Mas eu gostei do clima dos caras, num primeiro momento foi o que eu mais apostei. A partir daí, foi um lance muito doido, porque tinha um show, numa semana que a gente ensaiou, na outra semana o cara me liga: “pô, Clarence, vai ter um show no Mistura Fina, que a gente vai ter que fazer, como é que a gente pode fazer?”. Porque a gente nem tinha as músicas, o show estava marcado para um mês depois. A gente em duas, três semanas armou o repertório todinho, fizemos arranjo das músicas e atacamos no Mistura Fina. Daí é que a gente não se separou mais.
Rodrigo Scofield: A gente nas época tinha até outro nome.
Clarence Merria: É, na época era Confusion, o nome…
Central da música: De onde vem esse nome Umanoi?
Fernando Aranha: O nome Umanoi vem do Tupi-Guarany, significa “negro de origem” – não é literalmente, claro. É em cima de toda nossa influência, de todas as letras… O “negro de origem” quer dizer que todas as pessoas podem ter sangue, suíngue negro. É por aí.
Central da Música: Vocês, que são uma banda relativamente nova – 4 anos, e tal… o que vocês acham do cenário atual do rock nacional, dominado por flash back, volta do RPM, essas coisas?
Rodrigo Scofield: Bom, acho que a gente procura pensar pra frente. A música tem uma evolução, não tem como negar isso. As pessoas que têm uma cabeça musical legal vêm evoluindo, como o Lenny Kravitz, que tinha um determinado som e hoje em dia tem um som muito mais moderno… O new-metal é um movimento muito interessante, é um rock n roll moderno. Não tem como negar isso, não tem como a gente querer ficar pra trás. Acho que o RPM já teve o espaço deles e tudo o mais. É legal como flash back, mas como valorização do atual…
Rodrigo Scofield: E tem muita gente também que não tá no mainstream, não apareceu ainda… Mas tem muita gente fazendo coisa legal. O Rappa tá fazendo, eles já estão com um espaço na mídia que eles conseguiram com muita luta. Pedro Luiz e a Parede, que não está no mainstream, tá fazendo um negócio que não é muito rock,mas tá fazendo um negócio diferente e ninguém percebe.
Central da Música: E inclusive estão num selo independente dentro de uma gravadora…
Rodrigo Scofield: Exatamente… O próprio Charlie Brown Jr. tem um valor nesse cenário rock. Eu acho que todo mundo que tá buscando fazer uma coisa nova, diferente, tá dentro dessa proposta. Eu não concordo com esse lance de flashback, tentar reviver um cenário que já não é mais… Tem que pensar pra frente, sempre.
Clarence Merria: Eu concordo com o Rodrigo, sendo que eu acho que tem público pra tudo. O RPM ainda tem seu público da década de 80, tem a galera depois dos 30 que curte RPM… Eu acho que tem público pra tudo.
Central da Música: Aliás o público do RPM é formado quase todo por adolescentes…
Clarence Merria: Hoje? Eu não sabia disso. Sério mesmo… Essa eu não sabia. Eu não sei como se dá esse processo…
Rodrigo Scofield: Não, mas é importante falar que os caras estão fazendo composições novas, não é um bailão…
Clarence Merria: Eu não posso falar porque eu não tô por dentro do som do RPM, não conheço o trabalho novo. Conheço o que está rolando, regravação, e tal. Mas o trabalho novo eu tô por fora.
Central da Música: Vamos falar um pouco do disco. Como ele tem sido recebido?
Clarence Merria: Cara… eu acho que com muito espanto pela galera. A impressão que eu tenho… cara, eu ouço, a gente procura, estamos antenados no underground e a gente não vê um lance muito parecido com a gente. Acho que a gente tem uma característica legal. E a galera que tá ouvindo, a galera nova do cenário alternativo, vê o CD com um certo espanto.
Central da Música: Eu particularmente achei o disco seguro, bem feito… Não soa como uma coisa underground amadora, boba.
Clarence Merria: Acho que esse lance da sonoridade é também porque a gente teve a produção musical do Renatinho Ribeiro e do Bernardo Fonseca,e eles conseguiram direcionar nosso som sabendo que a gente não tá fazendo um som brasileirão, nada disso. A gente tentou fazer um som com a proposta dos gringos que fazem a coisa muito bem feita, que é rock n roll bem feito mesmo… Com a direção deles a gente conseguiu chegar num resultado muito bom no CD.
Rodrigo Scofield: Nessa questão da sonoridade, o disco já até traz uma identidade para o som: “essa é aquela banda que tem aquele CD que é independente e tá com uma sonoridade que pode ser de gravadora grande, internacional e tudo, etc”. Porque é um negócio diferente, a gente buscou criar uma identidade com o som e com uma qualidade de gravação legal mesmo sendo independente.
Central da Música: Vocês estão tocando em alguma rádio?
Rodrigo Scofield: A gente esteve na Rádio Cidade FM, na Vez do Brasil.
Fernando Aranha: E percorrendo as rádios alternativas.
Clarence Merria: Eu acho que é um caminho legal a se percorrer, esse lance da rádio comunitária, porque tem muita gente antenada. Eu acredito nisso. Eu tive uma experiência com meu primo, que mora em Madureira, tem uma galera que curte rock n roll… Eles estão antenados, ficam procurando, mesmo. Então tem rádios alternativas em Madureira que, se tá tocando rock n roll, eles estão por dentro. Acho muito importante fazer esse percurso com as rádios alternativas, até chegar numa rádio que dê uma projeção maior.
Rodrigo Scofield: É, porque tem muita gente que tá orfã de um som legal… Então acho que as rádios comunitárias, as rádios alternativas, são um caminho para se ouvir o que está acontecendo fora do mercadão.
Clarence Merria: Na rádio Fluminense o CD já tá lá, a gente só não sabe porque ainda não rolou, mas vai rolar com ceteza, porque a gente tem esperança e muita confiança no nosso trabalho.
Central da Música: A capa do disco tem uma imagem muito forte… Como foi feita aquela capa, vocês conheciam aquele menino?
Fernando Aranha: Bom, esse menino é da região aqui da Gávea (bairro da zona sul do Rio de Janeiro) mesmo. Tinha alguns meninos que jogavam bolinha no sinal, que pintavam a cara de palhaço, ficavam, jogando bolinha, fazendo malabarismo para ganhar o dinheiro deles… E a gente veio aqui com a fotógrafa, a Lena Torres, e a gente ficou lá uma tarde inteira com os meninos, fotografando e tal. E até temos grande pretensões de que os meninos apareçam no nosso clipe de estréia, que já está sendo bolando e desenvolvido pela gente junto com o Gustavo Millet. A gente ainda está nos preparativos, a gente já gravou umas cenas, no último show que a gente fez. Ficaram super-legais…
Central da Música: Qual vai ser a música?
Fernando Aranha: Provavelmente “Artigo negro”.
Clarence Merria: Eu acho que a princípio… a gente saiu pra tirar foto e tal, mas a gente não tinha idéia do que iria ser a capa do disco. Só que a imagem desse garoto ficou muito forte, a gente vendo as fotos, olhou e…”legal isso”. Tem a ver muito com o contexto social do CD, do protesto social, de ver uma criança… É uma cena bem carioca.
Central da Música: O próprio disco é bem carioca, vocês falam da menina de Bangu numa das músicas (“Essa mina de Bangu”). Vocês têm sido ouvidos no subúrbio, têm público lá?
Clarence Merria: Essa qustão de ser ouvido no subúrbio, a gente tá tentando percorrer essas rádios comunitárias, porque eu acho que é um público assim… A gente ainda não teve uma oportunidade efetiva de mostrar o trabalho pra esse público. Acho que tá rolando mais assim na zona sul, nessa região.
Rodrigo Scofield: E a gente se preocupa com isso, como a gente tava fazendo um discurso social, uma mensagem forte, se preocupou em mostrar pra galera do hip-hop, da comunidade da Rocinha, mostrar o CD pra eles avalizarem. É a linguagem própria deles.
Central da Música: Uma curiosidade: o que é aquele Guetoterapia que aparece nos créditos do disco de vocês?
Fernando Aranha: O Guetoterapia é o grupo do Vinny Max que faz uma participação no CD, junto com o DJ Roque, que é o DJ que de vez em quando faz show com a gente e que gravou no CD. Eles têm um trabalho junto, com muito hip-hop, é uma banda mesmo. Eles estão ainda em fase de produção, mas é um trabalho que vai chegar aí.
Central da Música: E aquela vinheta “Saci (a lenda)”? É em homenagem ao baixista de vocês? (risos)
Fernando Aranha: É, foi uma vinheta criada pelo Saci. A vinheta é porque ele fala muito, aí a gente taxa ele de “lenda” (risos)
Rodrigo Scofield: Ele conta várias histórias, aí eu falei: “ah, é aquele baixista lendário, o Saci…”
Conheça mais o trabalho do Umanoi no seu site oficial: www.umanoi.com.br