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Entrevista com Pedro Luis

Falar hoje em Pedro Luís e A Parede (ou PLAP, como alguns preferem), é falar de um dos mais interessantes grupos da MPB atual. Com 3 álbuns lançados – “Astronauta Tupy” (1997), “É Tudo 1 Real” (1999) e “Zona e Progresso” (2001) – criatividade extrema e batucada de sobra, os cinco rapazes vem desde 1996 oferecendo música de qualidade (rotulada por alguns como MPC: “música popular carioca”) e ganhando reconhecimento por artistas de renome e do público, apesar do PLAP não estar freqüentemente exposto pela mídia.

O líder dessa trupe é Pedro Luís, 40 anos, um carioca de talento inegável que, apesar de ganhar visibilidade popular há pouco tempo, tem de longa data um nome de respeito entre músicos e produtores; conhecido por alguns como “Fornecedor de Repertório”, suas composições já passaram por Ney Matogrosso, Rappa, Adriana Calcanhoto e Fernanda Abreu (prá citar alguns). Ele concedeu gentilmente ao MúsicaNews uma entrevista por e-mail onde fala do grupo, sobre o mais recente trabalho e outros assuntos.

MúsicaNews: Conte um pouco de como começou sua carreira e, consequentemente, o PLAP.
Pedro Luís: a minha carreira, particularmente, começou com a Paris 400, banda da qual eu fazia parte e que acompanhava o Asdrubal Trouxe o Trombone em seu último espetáculo, chamado “A Farra da Terra”. Com essa banda gravei minha primeira fita demo de nível profissional, com quatro canções, dentre as quais Sambock, que chegou a tocar na extinta Fluminense FM. Desta banda fazia parte, entre outros, Antonio Saraiva, meu parceiro em várias canções que fez uma espécie de link entre mim e Sidon e Celso e foi inspirador também da idéia da bateria desmembrada que marcou a sonoridade dos primórdios da Parede. Eu, Sidon, C.A. e Mário já havíamos tocados juntos na banda da Arícia Mess, na qual eu era diretor musical e violonista. Ali vínhamos desenvolvendo já uma parte da idéia sonora que seria aperfeiçoada na Parede: groove brazuca e Pop. Em 1996, depois de várias vezes sugerido por Sidon e C.A. que eu montasse um trabalho centrado nas minhas canções, pintou a oportunidade a partir de um convite do Michel Melamed, para fazer o fechamento de um evento com meia hora de música dançante. Ali foi dado o start para o baile.

Por que o nome Zona e Progresso para o terceiro CD?
Pedro Luís: achamos que esse nome definia bem o processo de gravação e produção do álbum. Bastante conturbado mas representando um progresso na concepção sonora da banda. Acaba que reflete também um pouco do estado de coisas que o país e o planeta atravessam. É também o nome de uma canção minha com Suely Mesquita e Arícia Mess, duas grandes compositoras e cantoras do Rio de Janeiro.

Como foi o processo de composição, escolha das músicas e gravação do ZeP?
Pedro Luís: nós da banda pré selecionamos as canções dentre 30 que eu havia gravado com voz e violão. Começamos a trabalhar umas 10 e no final do processo entrou Morbidance (um presente do excepcional Lula Queiroga) e Saudação a Toco Preto, do Candeia, que eu pesquei de um disco dele chamado Filosofia do Samba. Acabamos usando como base vários elementos do arranjo original.

A impressão que tive ao ouvir Zona e Progresso é que procurou-se fazer um disco tão orgânico quanto o disco de estréia, porém melhor resolvido. No “É Tudo 1 Real” o apelo pop é mais presente, mas ser perder a originalidade e o batuque. O que o ZeP traz de diferente com relação aos outros dois discos?
Pedro Luís: em primeiro lugar temos o orgulho de ter participado de todo o processo de produção do disco, desde a pré-história até a masterização. Decidimos que tocaríamos mais e nos preocuparíamos menos em editar. Decidimos que as faixas teriam sonoridades bem distintas, o que denominamos mudanças de página. Estávamos mais conscientes do som que queríamos ouvir desde a gravação até a mixagem. Esse disco também guarda o diferencial de ser um fonograma nosso (em Parceria com a MP,B).

Me parece que esse trabalho perdeu um pouco do sotaque carioca e incorporou alguma coisa da cultura nordestina (cito “Morbidance”, “10 de Queixo”, “Quem Vai Querer”, “Ciranda do Mundo”). Isso foi proposital e consciente ou é tão somente um reflexo da pluralidade cultural carioca?
Pedro Luís: o Rio é um espelho de todos os Brasis. Não negamos a força de certos acentos nordestinos, antes pelo contrário, mas adicionamos nosso inevitável sotaque de aqui nascidos.

Algumas músicas (além da performance de vocês no palco) parecem bastante lúdicas. Daí que vem a espontaneidade de vocês?
Pedro Luís: a nossa espontaneidade vem, creio, do prazer de tocarmos aquilo que escolhemos e de procurarmos tocar com leveza mesmo que o assunto seja pesado. É importante passar as histórias de maneira que cative a audiência. E na verdade estamos nos divertindo a valer nos shows. A Parede não falseia um espetáculo.

Para o último trabalho (assim como no primeiro) vocês contaram com a produção do Tom Capone, que é um excelente produtor de rock. Como se deu o diálogo entre o PLAP e ele e no que o Tom interferiu no som de vocês?
Pedro Luís: Tom na verdade é nosso amigo de longa data. Nesse disco, especialmente, ele disponibilizou sua estrutura para que realizássemos um disco que a princípio não tinha destino definido. Como diz o C.A. (ritmista dA Parede), de vez em quando ele passava e jogava uma granada do tipo “Tá uma merda” e ia-se embora, deixando pra gente resolver com os produtores, no caso, além de nós, o Álvaro Alencar e o Plínio Profeta. Na finalização ele mixou algumas faixas e deu a concepção inicial de algumas mixes. Na verdade ele é um dos responsáveis pela sonoridade fonográfica que traduz nossa concepção. Algo como um mestre da gênese do PLAP.

Falando em interferência (sem soar pejorativo), quais as influências sonoras da banda?
Pedro Luís: Isso na verdade é uma pergunta para ser respondida por toda a banda, mas podemos dizer que abrange uma gama que vai da música de raiz brasileira até o funk, o rock e o reggae. Tudo o que ouvimos e nos estimula musicalmente acaba virando uma influência.

O outro projeto que vocês coordenam, é uma extensão do PLAP? Poderia nos explicar melhor o que é o Monobloco?


Pedro Luís no meio do monobloco

Pedro Luís: O Monobloco surgiu basicamente de dois estímulos: O Celso Alvim (ritmista dA Parede) tem na sua história uma atuação como professor de percussão e bateria. Junto com Sidon Silva (ritmista dA Parede) eles coordenaram um bloco chamado Pancaducada, formado por alunos de percussão da ProArte (escola de música na Zona Sul do Rio) que tinha essa verve de batucada brasileira misturada com música, que é a história que A Parede vem desenvolvendo desde sua origem. O Bloco chegou a fazer algumas intervenções em shows nossos. No final dos anos 90 organizamos no SESC Vila Mariana, SP, uma oficina de percussão adaptando aos instrumentos de samba alguns grooves que havíamos desenvolvido na banda. Creio que esse foi o primeiro estímulo.

Quando estávamos gravando o 2º álbum (É Tudo 1 Real) Sidon sugeriu que gravássemos por cima de algumas faixas já pré-concluidas uma sonoridade de bloco, onde nós 5 tocaríamos instrumentos de samba. Sugeriu também que gravássemos em mono. Eu pensei: um bloco gravado em mono, então vamos chamar esse acontecimento de MONOBLOCO. Todos aprovaram a idéia. Esse era o segundo gen da história.

No ano de 2000 resolvemos propor ao RioArte (ligado a Secretaria das Culturas do RIO) uma oficina permanente de percussão, que geraria no final do ano um bloco que utilizasse os instrumentos de samba para tocar diversos ritmos. O formato foi se desenvolvendo pouco a pouco, mas com uma certa rapidez: queríamos um puxador com voz potente, carisma e que segurasse a onda do baile. Uma vez ou outra eu subiria para cantar junto algumas de nossas canções. Escolhemos um grande amigo com quem eu já tivera o prazer de trabalhar, o Serjão Loroza. Prá o cavaco convocamos o Rodrigo


Mais monobloco

Maranhão. meu parceiro em algumas canções, que toca bem e tem uma linguagem pop no cavaco elétrico, além de ser cúmplice da estética sonora que vínhamos desenvolvendo. Para a seção rítmica decidimos cada uma cuidar de um naipe de instrumentos (por exemplo: Mário Moura, baixista dA Parede, cuidaria do naipe de surdos). O Celso ocupou naturalmente o cargo de maestro da bateria. Chamamos alguns músicos amigos para junto aos alunos fazerem parte da seção rítmica (músicos do Bangalafumenga – de Rodrigo Maranhão -, do Rio Maracatu e outros tantos). Chamamos também o DJ Nado Leal para conduzir a festa entre os sets do bloco e eventualmente fazer intervenções junto com o bloco. O formato prévio estava definido.

Começamos a ensaiar para o público no Malagueta, em São Cristóvão. Mas a coisa não vingou como imaginávamos (isso era dezembro de 2000). Resolvemos parar e retomar só em janeiro em algum espaço da Zona Sul. Na 1ª sexta de janeiro estaríamos recebendo como convidado o Herbert Vianna; como era de praxe, a cada ensaio havia um convidado especial. Acertamos de fazer o retorno no Clube Condomínio, no Horto, como era nossa idéia original. Por ser logo depois do reveillon não tivemos de tempo de divulgar como gostaríamos, mas surpreendentemente o boca a boca levou um público expressivo ao local. Nas semanas seguintes o boca a boca somou-se a retomada da divulgação e o bloco virou um sucesso nas sextas feiras até o desfile de rua que arrastou uma alegre multidão do Planetário à Praça do Jóquei. Em 2002 o sucesso se multiplicou e já pensamos em mudar para um lugar maior em 2003, para poder acolher o público e não incomodar mais a vizinhança do Horto com ao grande fluxo de carros e público que tivemos esse ano.

A estrutura do Monobloco baseia-se na dos antigos blocos de carnaval?
Pedro Luís: No que diz respeito a retomada de uma alegria de intervenção de rua, sim. Mas é um bloco que toca de tudo: samba, funk, coco, charm, ciranda, congo e faz também uma releitura das tradicionais marchinhas carnavalescas.

O Monobloco gravará um disco no final do ano?
Pedro Luís: Esse é o nosso grande projeto para o 2º semestre.

Pegando o gancho, como você vê o Carnaval de hoje?
Pedro Luís: Eu vejo com otimismo a retomada de um carnaval de rua carioca. O Suvaco, o Monobloco, o Carmelitas, o Cordão do Boitatá, o Rio Carioca, Bangalafumenga, Rio Maracatú, vem se somar à resistências como o Cordão do Bola Preta, para recuperar a auto-estima do carnaval de rua do Rio. Gosto especialmente do carnaval do Recife Antigo, que já tive o prazer de presenciar 3 vezes.

Vocês já estão em turnê, certo? Quais as suas expectativas e por onde vocês pretendem passar?
Pedro Luís: Começamos a turnê em dezembro de 2001, mas interrompemos por conta da agenda intensa do Monobloco em janeiro e fevereiro. Retomamos em março, depois de umas pequenas férias coletivas (a 1ª em 6 anos de banda). Vamos rodar o Brasil no 1º e 2º semestres, com uma interrupção em julho, quando estaremos indo pela 4ª vez para a Europa.

Pelas primeiras apresentações que vocês fizeram, o que vocês puderam notar ou observar de bom, interessante e/ou curioso?

Pedro Luís: O gratificante é sempre observar como há platéias as mais diversas possíveis sempre interessadas em conhecer novidades sonoras. Não somos um grande sucesso de rádio, mas isso não tem tanta importância, pois a coisa se alastra por outras mídias.

Vocês mudaram recentemente de gravadora por motivos comerciais e hoje gozam de uma liberdade concedida a poucos artistas (de massa) no Brasil, estou errado? Digo isso porque vejo alguns famosos terem seus contratos rescindidos por não se “adequarem ao mercado”. O que você pensa disso? O PLAP realmente é privilegiado nesse aspecto?
Pedro Luís: Creio que sempre fomos, de uma certa maneira. Nunca nos impuseram repertórios ou gêneros. Estamos agora numa situação semelhante à do 1º álbum, em que um selo pequeno está associado a uma grande empresa com força de distribuição. Acho que é o formato mais saudável nessa selva que é o showbizz brasileiro.

Para onde a MPB está caminhando? Quais os novos rumos que ela tem seguido e o que de bom está por vir?
Pedro Luís: A MPB são diversas MPBs. A instituída e dezenas de outras que são produzidas e nem sempre têm a chance de se mostrar. Creio que a articulação entre os artistas é uma grande saída pois ninguém melhor que nós para saber de nossas necessidades e possibilidades. Acho que a internet e o barateamento dos meios de produção também permitem a criação de um outro mercado a médio prazo, assim como a alternativa da banca de jornal e das livrarias especializadas como possibilidades de ponto de compra de cds.

De acordo com o release do último CD, você formou-se “antropólogo urbano na faculdade da vida”; as relações humanas são temas corriqueiros em suas letras. Então na opinião do “estudioso”, o homem passa por um processo de evolução ou involução?
Pedro Luís: Acho que passamos por um período de grande avanço tecnológico, mas de grande carestia. O Brasil é um grande exemplo: internet de ponta misturado à fome e analfabetismo, miséria de valores humanos e etc. Não me acho estudioso nem antropólogo, mas um observador privilegiado, que conseguiu, junto com uma grande turma de amigos, impor o seu jeito de criar independente certas regras de mercado, e dessa maneira passar pra o Brasil e o planeta o nosso recado. Me sinto, sinceramente, funcionário do Planeta.

Encerrando, deixe seu recado pro nossos internautas
Pedro Luís: Rapaziada, se liga para realizar sempre alguma coisa que te dê prazer profissional, pois isso provavelmente vai garantir a boa qualidade do seu trabalho.
P.S. visitem nosso site – www.plap.com.br

Mais Pedro Luis e a Parede

Site oficial: Localizado no endereço www.plap.com.com.br, o site do Pedro Luís e a Parede é completíssimo. Destaque para a seção onde pode-se ouvir, na íntegra, via streaming, todas as músicas dos três álbuns da banda.

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