Sana Inside » 'Entrevista com Marcelo Nova'

Entrevista com Marcelo Nova

       Um dos poucos roqueiros “à moda antiga” que ainda existe no Brasil, Marcelo Nova, ex-líder do Camisa de Vênus e ex-parceiro de Raul Seixas, comemorou neste mês 50 anos de vida, boa parte deles dedicados ao rock (“a única coisa que eu sei fazer”).


       Tocando atualmente com uma nova banda, que inclui um baterista de 16 anos, Marcelo presenteou os fãs há poucas semanas com o lançamento da caixa “Tijolo na Vidraça”, com regravações de músicas de várias fases de sua carreira, além de vinte gravações inéditas. Conversei com ele por telefone, no início de agosto (antes, portanto, da festa que ele realizou nos últimos dias 14 e 15 aqui em São Paulo), sobre esse novo lançamento, o projeto “Grampeando em público”, Raul Seixas e muito mais. É só conferir a seguir:


MúsicaNews: Como surgiu a idéia para fazer o “Tijolo na Vidraça”?
Marcelo Nova – Foi um convite que recebi do Hélio Costa Manso (diretor artístico da gravadora Som Livre). Topei e fizemos.


MúsicaNews: Quando você lançou o “Grampeado em Público” disse que era o começo de uma discografia alternativa, você parou com ela ou pretende lançar novos volumes?
Marcelo Nova – Na verdade duas coisas; a primeira é que ela parou porque essa caixa tá saindo agora, mas a gente começou a trabalhar nela desde o ano passado. Então, o fato de ter 49 músicas na caixa e ter de fazer a seleção de repertório, de remasterizar todas as músicas velhas e de masterizar as novas, foram 20 músicas novas, 20 gravações inéditas que tive de ir para estúdio gravar, então foi uma coisa que demandou muito tempo, depois teve a parte gráfica, selecionar material fotográfico. Mas provavelmente até o fim do ano deve estar saindo mais alguma coisa do “Grampeado”, porque o “Grampeado” na verdade eu entreguei para um cara chamado Luís Augusto Conde que é um fã-maluco, um desses fãs-malucos que eu tenho que sabem mais da minha vida do que eu, então ele é um cara que viaja 300, 400 kms pra assistir show e ele gosta, se interessa, arquiva, ele tem mais de 38 shows meus inteiros gravados. E aí, como eu não tenho muita paciência pra isso a essa altura campeonato, eu deixei com uma pessoa que gosta e que vai fazer a seleção. No “Grampeado em Público”, por exemplo, ele escreve “Professor Rock n Roll” no encarte, aquilo foi um show, e eu acabei mandando pra ele e disse “velho, lança e aí faça o que você quiser, selecione as músicas”. Ele tá animado com a história, ele tem um material vasto e deve sair alguma coisa acredito que em breve, final do ano, início do próximo deve estar saindo o III e o IV.


MúsicaNews: Em outubro Eric Burdon vai lançar um disco de músicas inéditas com 4 músicas compostas com você, você participou da produção do disco ou participou de alguma faixa como ele fez em “Quem é Você?” do Camisa de Vênus?
Marcelo Nova – Não, não, na verdade nós fizemos algumas demos antes em Nova York com uma banda dele e comigo, mas agora ele entrou em estúdio e foi gravar e eu não participei de nada, eu tava aqui no Brasil e tava com compromisso, mas o disco dele também é outro que deve sair até o fim do ano.


MúsicaNews: O que aconteceu com o “Caldeirão das Artes”? (Projeto do Governo de São Paulo que reunia artistas de universidades que teve Marcelo Nova como Diretor artístico)
Marcelo Nova – Eu fui comunicado de que a Secretaria da Cultura ia parar por um tempo indeterminado com o “Caldeirão” e também não tive maiores justificativas do porquê que ia parar. Mas sabe como é política né? A gente sabe como é política…


MúsicaNews: Mas também teve essa candidatura do Fernando Guimarães (diretor-geral do “Caldeirão”) pra deputado…
Marcelo Nova – Mas o Fernando talvez tenha sido a pessoa que mais batalhou pelo “Caldeirão”, agora não pode esquecer que todo envolvimento, todo projeto que tem sua origem no governo atende, ou pressupõe-se que deva atender, alguns interesses que necessariamente não são os artísticos. E eu, quando aceitei a direção artística do projeto fui muito claro, eu disse “Olha, meu boxe é meio Maguila, eu sou meio durão, eu não tenho aquele jogo de cintura de Cássios Klei” entendeu? Então enquanto eu achar que é isso… senão eu aposto que não vão faltar pessoas interessadas em participar do projeto, mas o projeto acabou sendo suspenso, não sei lhe dizer se vai voltar, se não vai e aquela coisa né cara, é assim que é.


MúsicaNews: E essa briga com o Samuel Rosa, do Skank, que disse que você era mal companhia pra Raul Seixas, quando começou?
Marcelo Nova – É engraçado porque é uma acusação tão imbecil né, quer dizer, o que quer dizer “má companhia”? O que ele quer dizer com isso? Que eu dava droga pra Raul Seixas, que eu dava álcool pra ele? E parece uma coisa de tia, minha tia que dizia pra meu primo não andar comigo, papo ridículo, uma coisa ridícula, tá falando que Raul Seixas, um homem que naquela altura tinha mais de 40 anos de idade, uma afirmação dessa é quase como chamar Raul de babaca, um cara que não sabia com quem ele andava, não sabia o que queria, mas tudo bem, agora conta ponto falar de Raul né, Raul se tornou um mito indiscutível, então qualquer idiota agora quer falar de Raul, gente que inclusive nem o conheceu fala como se fosse irmão de sangue, e isso dá matéria, você mesmo tá me fazendo pergunta por causa disso, então o cara “fita” Raul num contexto totalmente equivocado né… e onde esses caras estavam quando Raul tava mal? Entendeu, passando necessidade, sem dente? Onde toda essa gente tava, entendeu? Quando ele tava aqui? Agora num interessa mais, agora ele tá morto, agora o que interessa é a obra, então esse tipo de afirmação é coisa de gente bunda mole mesmo né…


MúsicaNews: E o que você achou da “homenagem” de Caetano para Raul?
Marcelo Nova: Caetano, esse negócio de que Raul tinha uma vontade “fela da puta” de ser americano, eu nunca vi isso não, agora também nunca vi Raul ter uma vontade “fela da puta” de ser africano.


MúsicaNews: Assim como existe o Raulseixismo, raulseixistas, você acredita que exista atualmente o Marcelonovísmo?
Marcelo Nova – Num sei se existe cara, na verdade o que eu tenho pra dizer tá nas minhas músicas e nas minhas letras, então quem se interessa por mim recomendo que vá ouvir meus discos. Porque aqui tem essa história de querer saber se o cara é boa gente, se o cara é casado, se é solteiro, se o cara bebe, se fuma, se não fuma, o que ele faz, qual é a cor predileta, isso não tem a menor importância né, o cara mais legal que eu conheci na minha vida inteira foi meu pai e eu nunca chamei ele pra compor comigo. Então, quanto a esses “ismos” que você está se referindo acho que se alguém se interessa, seja lá quem for, se interessa por mim, pelo meu trabalho, vá ouvir minhas músicas e eu acho que ta tudo ali, tudo o que interessa tá ali.


MúsicaNews: Você acha que é o último roqueiro “honesto” do Brasil, que faz o que gosta sem “se vender”?
Marcelo Nova – Olha cara num sei se eu sou tão honesto assim, eu já tomei emprestado uns trechos de músicas de outros caras (risos). Mas eu sei fazer isso, rock n roll, quer dizer, é a única coisa que eu sei fazer, nunca fiquei pulando de galho em galho, nunca fiquei preocupado com qual é a nova ondinha, é a minha benção e a minha maldição.


MúsicaNews: Você ainda tem algum contato com os ex-integrantes do Camisa de Vênus?
Marcelo Nova – Ah, tenho sim, ontem mesmo eu falei com o Robério, ele tá morando em New Orleans.


MúsicaNews: E vocês tem algum plano de voltar?
Marcelo Nova: Não, não… a gente vai fazer uma reunião agora dia 14 e 15 no Sesi, provavelmente com alguns ex-integrantes da banda, talvez nós façamos alguma brincadeira, alguma coisa juntos mas nada de reunir de novo pra gravar não. Uma coisa que as pessoas precisam entender é que banda de rock, cara, é feita pra acabar, você entende? Não existe sentido uma banda de rock perdurar até… senão vira Rolling Stones, você entende? Fica Mick Jagger com 60 anos mexendo aquele cu magro, querendo mostrar que é garotão, que tá malhadinho e que tá em forma, é ridículo. Então, banda é feita pra acabar, e aí que tá o grande lance da banda, é quando ela acaba, porque é uma coisa de garoto, aquela coisa de união, de estar junto, compartilhar as coisas e banda pressupõe adolescência, pressupõe coletividade, então de vez quando, eu que já tô chegando nos 50 anos, de vez quando é divertido brincar disso, reunir os caras da banda e tal, é divertido. Mas fazer disso uma coisa eterna, transformar isso numa coisa eterna de alguma forma é você estar em busca da fonte da eterna juventude e eu definitivamente não acredito nisso.


MúsicaNews: Tem alguma banda brasileira nova que mereça destaque atualmente ou você acha que tá tudo muito chato e igual na nossa cena roqueira?
Marcelo Nova: Cara, veja bem, eu não sou a pessoa mais indicada pra falar porque eu tô tão atarefado com meu próprio trabalho, que eu não tô a par do que tá saindo de novo, se tem alguma coisa nova que surgiu interessante, você tá entendendo? Evidentemente deve ter, porque existem milhares de bandas espalhadas pelo país, a grande maioria não tem acesso a chamada grande mídia, né? Agora, por outro lado, as que têm já passaram pela… fábrica de boneco das gravadoras, já passaram pela “fabrequeta” de boneco então ficam aí todos iguais, todos se vestem iguais né cara? É impressionante, todos têm o chapeuzinho virado pra trás, uma correntinha pendurada no pescoço, uma calçona folgadona com a camiseta, todos se vestem iguais. Então eu pergunto: se o lance é ser rebelde, porque todo mundo se veste igual? (risos)


Para finalizar, quais os planos para o ano que vem? Você irá relançar o “Sessão Sem Fim”?
Marcelo Nova – É provável que isso aconteça, é porque ele tá fora de catálogo há muitos anos e ele foi muito mal distribuído né, é o meu disco que menos vendeu até hoje. Ele foi muito mal distribuído, foi um disco que foi encontrado apenas e tão somente aqui em São Paulo, fora de São Paulo é um disco que praticamente ninguém conseguiu, então eu espero dar uma chance melhor pra ele no próximo ano.


Saiba mais sobre Marcelo Nova
www.marcelonova.com.br – Apesar do visual pobre, o site oficial de Marcelo Nova é riquíssimo em conteúdo. Tem a discografia completa do cara (onde póde-se ouvir todas as faixas de vários discos), uma “linha do tempo”, com tudo que ele andou fazendo ao longo da carreira, artigos de personalidades da música falando sobre o que acham de Marcelo Nova e muito mais. Vale sua visita….

© 2008 Powered by WordPress