Arnaldo Antunes fala sobre seu Paradeiro
Para quem acha que a música brasileira passa por uma fase bocejante, é hora de conhecer tanto o álbum “Paradeiro”, quanto o show que divulga esse mais novo trabalho de Arnaldo Antunes.
“Paradeiro”, é o 5º disco da carreira solo do ex-Titã. Outros projetos foram desenvolvidos enquanto as canções desse disco eram compostas, como a trilha sonora do espetáculo “O Corpo”, e as músicas escolhidas para filme “O bicho de 7cabeças”.
Antunes é um artista que, o que faz melhor é mesclar as diversas formas de arte: as plásticas, sonoras, poéticas… Após a primeira sensação, que é o estranhamento, ficamos sensíveis à obra e podemos saboreá-la, principalmente as suas letras, resultado de um bom trabalho lingüistico e estético. Ele é um poeta que emergiu da música popular para as prateleiras das livrarias, pois tem 5 livros publicados. Sua obra por si só, afirma seu privilégio de ser um artista completo, que transita com tal liberdade pelas cores, movimentos e imagens com a mesma maestria que rege seu trabalho apoiado por músicos vindos de diversas regiões do Brasil. Há baianos, paulistas e cariocas. Podemos destacar as participações de Edgard Scandurra, Marisa Monte, Davi Moraes e a produção de Carlinhos Brown e Alê Siqueira.
No show, Antunes apresenta 5 músicas do novo disco, entre elas a faixa que dá título ao álbum, que é quando ele divide o microfone com sua mulher, a tecaldista Zaba. Ele também relembra antigos sucessos como “Socorro”, “Essa Mulher”, “Música para Ouvir”.
Conversei rapidamente com ele sobre o disco e a nova turnê no último dia 20, exclusivamente para o Central da Música, entre a passagem de som e o show que ele faria a seguir no SESC Vila Mariana. Confira:
“Paradeiro” foi considerado por alguns críticos como seu disco solo mais “pop”. Alguns até insinuaram que o motivo dessa “guinada” poderia ser o fato de você querer atingir um público maior. Você se preocupa com isso?
Arnaldo Antunes: Olha, eu não acho que é uma guinada, e isso vem sendo repetido muito pela imprensa de uma forma geral. Isso já aconteceu com ” Um silencio”, “Um Som”. A cada disco que eu lanço, as pessoas parece que falam “Ah, agora o Arnaldo está mais pop!”. Como se tivesse ficado um trauma por eu ter feito um trabalho muito experimental como o “NOME”, que cruzava poesia, música, vídeo. De certa forma chocou muito as pessoas. Eu nunca deixei de fazer musica popular, de ter uma comunicação direta com um número grande de pessoas. Agora, ao mesmo tempo tento fazer um trabalho original que não seja apenas repetição daquilo que as pessoas já conhecem, um trabalho que esteja mexendo, alterando a sensibilidade delas.
Nesse seu novo disco, há uma base mais samba-reggae nas canções, diferentemente dos discos anteriores, que tinham uma base mais pop-rock. Essa “mudança” na sonoridade se deve à participação do Carlinhos Brown na produção ou você já a tinha em mente?
Arnaldo Antunes: Acho que todos os meus discos tem uma certa diversidade de ritmos e de gêneros. O meu trabalho solo, tem esse desejo de abrir um pouco o leque dessas atividades e transitar entre os gêneros com muita liberdade. Nesse disco isso acontece de uma forma muito satisfatória por causa do convívio com o Brown. Há a participação de músicos novos, também baianos, todos com a liberdade de lidar com as informações musicais novas.
O Edgard Scandurra, além de participar do seu disco irá tocar no seu show hoje. É apenas uma participação especial, ou todos as platéias terão o prazer de ver vocês dois juntos nos palcos, nessa turnê?
Arnaldo Antunes: Ele vem trabalhando comigo desde o primeiro disco, e em todos ele vinha tocando ao vivo também. Agora, a agenda dele foi ficando cada vez mais cheia com o Ira! e foi impossível continuar na banda. De vez em quando, ele vai fazer uma participação especial, como hoje. Mas amanhã ele não vai poder porque se apresentará com o Ira!. Vai ser sempre circunstancial a partir de agora. Vamos contar com as participações dele nas próximas gravações. Nunca vamos deixar de ter essa presença dele no meu trabalho, que eu acho super importante.
Você está lançando seu CD “Paradeiro” em casas de shows pequenas, como o CCBB (RJ), o SESC Vila Mariana (SP). Atualmente está difícil viabilizar shows para grandes platéias?
Lá no Rio, apesar de ser pequeno, foi super legal e espero voltar em breve. Mas aqui no SESC, eu não acho pequeno. É uma casa de médio porte, seiscentos e tantos lugares. Isso não é opção, é o que dá pra fazer. Ficamos sempre circunscritos às condições que precisamos para realizar o show. A dificuldade para fazer show é a mesma para todo mundo. Na verdade para você colocar muita gente, tem que ter o preço do ingresso acessível para todo mundo. Ao mesmo tempo, você tem que ter um certo sucesso de rádio para poder levar público. Uma coisa depende da outra, está ligado a uma estrutura, e tentamos fazer aquilo que é compatível com o nosso momento. No SESC Vila Mariana vamos fazer 3 dias cheios. O que eu sinto falta é de mais casas de médio porte, como aqui. Para quem está começando é muito difícil, tem poucos lugares assim para tocar hoje em dia. Tem muitas casas grandes como, por exemplo, o Olympia, o Credit Card Hall, e é difícil você lotar uma dessas. Então é preferível você fazer num lugar pequeno cheio a um lugar grande vazio.
Você sempre traz alguma regravação nos seus discos. Gostaria que você comentasse em especial a da música “Exagerado”, de Cazuza.
Arnaldo Antunes: Sempre gostei da obra do Cazuza, especialmente essa música que por acaso nunca foi regravada por ninguém. Quem sugeriu para eu regravar foi o Brown, e foi a única sugestão que ele deu no repertório de “Paradeiro”. Eu me encantei de fazer ela assim, meio bossa nova, num formato mais sereno, até como contraponto com o que diz a letra. Essa é outra forma de exagero, através da serenidade e foi muito legal. Dividi a letra de um jeito diferente da gravação original do Cazuza. No caso, foi uma recriação da canção. Aliás, todas as interpretações que faço são assim, e os outros autores que regravo procuro reler suas músicas de uma forma muito pessoal e diferente das que elas já tenham sido gravadas.