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Vitrine Viva: Outros sons, outras batidas, outras pulsações
Ave!! Como vai todo mundo? Certo? Se liguem só nessa letra e depois a gente conversa:
ON THE ROAD
Letra e música de Wander Wildner – Inspirada em Jack Kerouac – Ed. Doberman
Não me importa onde quer que eu ande
Não me importa onde quer que eu more
Minha mochila está sempre à mão
E eu estou sempre pronto prá partir
Voce me viu quebrar a cara
Voce me viu tentando tudo
Me sacrifiquei o tempo inteiro
Decidi abrir mão de tudo
Mas nós sabemos que isso não vale nada
Nos sacamos a vida sabemos como domá-la
Sabemos que o negócio é continuar no caminho
Curtindo o que pintar da maneira tradicional
Afinal de que outra maneira poderiamos curtir
Não me importa onde quer que eu ande
Não me importa onde quer que eu more
Minha mochila está sempre à mão
E eu estou sempre pronto prá partir
Sempre à mão, pronto prá partir
Ou ser posto prá rua, ou ser posto prá rua
Letra tirada da página oficial do Wander Wildner.
E aí? Sentiram a poderosidade do negócio? Pois é, isso como vocês já viram logo aí em cima, é o maravilhoso, sujo, totalmente punk, rock, e brega, WANDER WILDNER !!! The Rock n Roll Man ! Bem, o único cara vivo que se equipara à ele é Marcelo Nova, mas do Marceleza a gente fala em outra oportunidade.
Na verdade o foco principal hoje nem é o Wander e sim essa descaralhante – com licença, Zeca Jagger – letra! Então, vamos embarcar nessa, meus amigos.
Como já está explícito, a letra de “On the Road” foi inspirada no livro “On the Road” (dããããã…) do escritor beatnik Jack Kerouac, um dos maiores – pessoalmente, eu o acho The Best – escritores de sua geração e um terço dos componentes da Santa Trindade Beat; os outros dois são: Allen Ginsberg e William Borroughs. Não vou ficar chovendo no molhado, pois se você curte Rock n Roll, suponho que deva ao menos conhecer um pouquinho de Jazz e Blues – Vê lá, hein! Não vá me decepcionar! – e por tabela, suponho que seja inteligente o bastante para gostar de ler, e assim como o Nescafé, uma coisa leva à outra, você já ouviu falar nesse movimento maravilhoso e seus expoentes. Então tá. Mas se não conhece, tudo bem, você ainda pode ser salvo das profundas do inferno. Vá atrás, meu rapaz! Ou minha amiga… ou você aí…
Assim como James Dean, o movimento Beatnik nunca teve relação direta com o Rock, mas antecipou mais que perfeitamente toda a sua essência e esplendor. Assim como Dean, os escritores beats se amarravam e se deixavam levar pelo Blues e pelo Jazz, principalmente o Bebop. Esse era o “Rock” dos caras, sua bateria para recarregar toda a revolta e alucinação de todas as almas atormentadas daquela época. Are you experienced? Se sim, sabe que o negócio é perigoso, man…não é pra qualquer um, não!
Para quem pensa que a coisa só começou a ficar braba com a macoinha dos Beatles e do Dylan, ledo engano. Os blues/jazzmen daquela era já eram calejados no esquema e sabiam sofrer com estilo. A tábua dos mandamentos do Rock foi escrita bem antes, com o sangue daquela gente sofrida, que não era popstar, que não tinha como comer direito, que não queria ser bonzinho, não queria se vender e prostituir sua música, só queria descobrir o básico: Onde é que vai dar tudo isso, afinal? E o “isso” era nada mais, nada menos que a VIDA. Sem enganações, sem a perspectiva de morrer sendo um funcionariozinho público de merda, que é obrigado a baixar a cabeça para tudo e todos, que é forçado a matar todos os seus sonhos pra sobreviver submisso por um prato de comida, ou viver o resto de sua existência sonhando com o que poderia ter feito se tivesse tido coragem de ter dito não.
Estou falando tudo isso pelo seguinte: O Rock não é som. É atitude, cara. Não interessa se você faz forró, chorinho, samba ou Hardcore…o que importa é saber libertar seus sentimentos mais vívidos e não ter medo das conseqüências. Tem de dizer não (salve, Inocentes) e dar a cara pra bater. Tem que esquecer o preconceito idiota que assola, não só o mundo da música, mas o estado geral e abrir a cabeça para todas as alternativas que entrem em contato com suas idéias e pensamentos.
Resolvi escrever sobre isso porque hoje à tarde estava em uma loja de discos garimpando pérolas, quando três moleques entraram no recinto e perguntaram ao balconista o que ele tinha de som “louco” pra curtir. Nota: todos os três com aquele uniforme básico – camiseta preta de heavy-thrash metal e cara de mau/enjoado. Quando perguntados que estilo de som “louco” eles curtiam, vieram com essa: – Ah, a gente é bem eclético. Qualquer coisa pra subir a adrenalina tá do caramba!
O balconista, já sacando, resolveu dar uma esnobadinha na molecada. Pegou alguns CDs e começou a tocar algumas faixas.
- Já que vocês são bem abertos a todo tipo de som - disse ele -, vamos ver se curtem isso:
E o cara começa a tocar Salt Peanuts, com o Dizzie Gillespie & his All Star Quintet.
- Nossa, tio! Que que é isso? Puta coisa velha! Dizem entre espantados e indignados com o balconista.
- Ué! Cês não disseram que eram bem ecléticos? Pô, isso é Gillespie detonando! É pena que no momento eu não tenha a versão com o Charlie Parker! É de foder o cérebro!
- Tá tirando a gente? Isso aí é baile da saudade! Não tem Rock?
-Claro. Já sabia que não iam curtir Jazz mesmo. Era só pra ter certeza… Vou separar algumas pedradas do Rock pra vocês ouvirem…
Nessas alturas, eu já estava totalmente esquecido das minhas tarefas e só prestava atenção na tiração de sarro do balconista em cima da garotada. E ele começa a rolar o Rock. Fez uma lista cronológica de petardos. Presta atenção na seleção; pérolas aos porcos:
Eddie Cochran, Summertime Blues.
The Sonics, Boss Hoss.
The Seeds, Love Special Delivery.
- Ô tio! Vai ficar tirando sarro?
- Como assim, tirando sarro?! Vão me dizer que isso não é Rock? Vocês não conhecem isso?
- Não. É muito chato. A gente é eclético, mas só com som radical – Nota do colunista: Que diabos quer dizer ser “eclético” com som “radical”, meu Deus do céu??!! -.
- Mostra o que cê tem de metal aí.
O balconista dá um suspiro de desgosto debochado e pergunta:
- Querem conhecer o berço do metal? A inspiração pra tudo isso que vocês curtem?
- Manda!
E o balconista manda:
Cream, I m So Glad – ao vivo.
Blue Cheer, Parchment Farm.
The Who, Shakin All Over.
Beatles, Helter Skelter. Na minha modesta opinião, a música mais pedrada já feita na história. Muito metaleiro (odeio esse nome) precisa ouvir pra aprender como é que se faz barulho…
E a cada trechinho de música que era tocado, a molecada se esforçava, não pra se sintonizar com aquilo, mas pra entender como é que o balconista podia achar aquele negócio bom. E ficavam, uns desdenhando e o outro, enaltecendo. Finalmente, o Balconista, dando aquela risada de desistência:
-Aí, gente, desencana. Eu desisto. vão praquela seção à direita, que lá tem o que vocês gostam.
Enquanto a molecada fuçava o que eles tanto queriam, eu fui trocar uma idéia com o pobre homem lutador.
- Muito boa a sua seleção. Pena que não valeu a pena.
- É, mas às vezes dá certo. Às vezes a gente encontra uma garotada que tem cabeça pensante e sabe o que realmente é bom.
Passados uns vinte minutos, chegam os três, cada qual com uns CDs para pagar. Entre alguns títulos, coisas como Entombed, Iced Earth, Brutal Truth…me lembrei na hora do Massacration, do Hermes e Renato…
Pagaram e foram embora, satisfeitos com o que tinham encontrado. O balconista sacudiu a cabeça e me falou:
- É foda! Mas acho que tem que ser assim mesmo. O eterno conflito de gerações. Um dia eles se tocam.
- Sei não – respondi – , depois do que você mostrou pra eles e a cara que fizeram, vai ser sorte chegarem aos 25 anos sem o cérebro atrofiado.
E foi assim. Triste, não? Seria ótimo se as pessoas tivessem um pouco mais de interesse em música num todo e não só em um único estilo. Porque afinal, se fizéssemos uma sessão de regressão com qualquer tipo de estilo musical, veríamos que tudo começou com o primeiro batuque numa pedra, ou tronco, ou sei lá o quê, por algum ancestral milenar do homem. E um bom exemplo dessa cadeia musical é a música lá em cima, do Wander. O cara se inspirou num livro escrito há mais de 60 anos, de um escritor fissurado em Jazz; esse livro influenciou a segunda geração do Rock, e entre tantas outras águas, acabou virando um puta som punkada feito por um sujeito que, além de ser punk, admite total paixão pela música brega.
Portanto, gente, sejamos mais abertos à tendências diversas da música universal. É cultura, e cultura nunca é demais pra cabeça e pro coração. Não concordam?
Um balconista legal atendendo um cliente pentelho