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The Strokes e a velha salvação do Rock

Quando eu era um jovem – hum… deixa disso, não faz tanto tempo assim… -, descobrindo tudo, lendo absolutamente tudo sobre o rock, existia uma coisa que me deixava totalmente perdido no espaço: A história de quem tinha vivido in loco o lançamento do mais impactante disco do mundo – o Sgt. Pepper. Juro que era angustiante tentar imaginar aquilo que todos relatavam; aquelas histórias do tipo “Onde você estava quando ouviu pela primeira vez o disco?” e “Como ele afetou sua vida?”. As experiências relatadas eram inimagináveis. De repente, em uma manhã qualquer você liga o som do carro, ouve uma música e isso te causa um choque. Um choque tão grande que você descobre que as coisas nunca mais serão da mesma forma que antes. Essa era a sensação que a maioria das pessoas relatou quando perguntadas o que foi o evento Sgt. Pepper.


Ser adolescente nos anos oitenta pra mim foi, a cada disco que surgia, procurar uma “Sensação Sgt. Pepper”. Sentir aquele choque que atingiu tanta gente nos anos sessenta e parecia ter se perdido nas décadas vindouras. Mas nada chegava perto. E olha que meu gosto era bem eclético. Acho que o que mais se aproximou de algo como o Pepper foi o The Queen is Dead dos Smiths. E ele nem chegou raspando perto daquela comoção mítica que eu tanto procurava…


Enfim, desencanei de ficar acreditando em coelho da páscoa e segui em frente, sem pensar nessa obssessão. Mal sabia eu que em breve, sem sequer esperar, encontraria o pote de ouro.


Numa noite, voltando de mais um dia exaustivo de trabalho, chego em casa e ao velho modus operandi: Ligo o rádio, vou tomar um banho e quando volto pro quarto ouço, na Brasil 2000 FM (R.I.P.) o “Lançamento Nosso de Cada Dia”, programa que enfocava as principais novidades da música pop. Era 1997 e pela primeira vez eu ouvia “Paranoid Android” do Radiohead. Aí eu senti aquele choque! E que choque! Eu finalmente havia descoberto o que é ouvir um Sgt. Pepper. É realmente uma experiência única. Algo que você jamais pensou existir te prende a cabeça como fórceps e dá uma chacoalhada violenta. Algo adrenalínico, orgásmico mesmo. A música certa tem o poder de fazer isso, por mais incrível que possa parecer; o casamento das ondas sonoras exatas com seus neurônios. E é isso. Ok Computer, do Radiohead. O DISCO, o Sgt Pepper´s dos anos 90 (surgido exatamente 30 anos depois. Será que outro igual só daqui a mais 30?).


Hein? o quê? Ah, é! Os Strokes… huuummm… bom, logo que começou o auê em cima dos caras, corri pra internet pra conferir o som dos novos “salvadores”. E quando ouvi… SURPRESA! Só um ótimo disco de Rock n Roll. Nada mais que isso. Letras absurdamente bem sacadas, um som que nos remete direto ao melhor que os Kinks, Stooges e Velvet já fizeram. Um disco nota 10 e que eu já desbotei de tanto ouvir. Mas e daí? Onde está a salvação nisto, se as bandas mencionadas há pouco já tinham feito o mesmo e primeiro que eles? Os próprios caras reconheceram isso ao batizar o disco de “Is This It?”. Ponto pra eles. E o que é mais importante: Mas que pôrra de salvação é essa que tanto dizem que o rock precisa? Ser salvo do quê? E ainda por cima com a indústria oficial adotando a posição de papagaio de pirata dos caras!


Oras, só pode ser brincadeira! Foi a própria indústria que criou essa busca de messias de temporada, pra chamar a atenção e vender qualquer um, como mais um produtozinho pronto pra ser consumido e pra você depois cumprir sua obrigação de bom cidadão: jogar a embalagem no lixo. O rock não precisa de salvação nenhuma, precisa, sim, de músicos que tenham amor e convicção pelo que fazem, que não se deixem envolver pelas conversas de viúva negra da indústria fonográfica e saibam que não se pode enganar a todos o tempo todo.


E é aí que os Strokes tem a chance de marcar pra sempre a história do rock com seu carimbo. Eles estão capitaneando, mesmo que involuntariamente, uma onda gigante de bandas que estão sendo “descobertas” pela mídia. O rock n roll sempre foi contestação, fúria, dizer não, e mais do que nunca isso é possível: MP3, internet, comunidades virtuais, informação, pirataria… está tudo aí. É só pegar e a revolução está montada. Essa é a IMPORTÂNCIA, e não a salvação, que Julian Casablancas e sua turma tem a oferecer se continuarem a fazer “apenas” ótimo rock n roll. Eles estão seguindo certinho, por enquanto, a cartilha Caminho Suave do rock: estão cagando pra toda a babação de ovo em cima deles. E talvez, se existe alguma coisa próxima de salvação, é fazer exatamente o que não se espera, é ser o filho malcriado. O rock tem que ser ingrato com a indústria, porque com certeza ela será com ele, mais cedo do que se espera. Esse jogo é velho e os Sex Pistols já mostraram como é que se faz…


Resumindo, a diferença entre o OK Computer, o último disco de impacto surgido (pelo menos até agora) e o Is This It é esta: Enquanto o Radiohead ousou virar a cara para o previsível e as fórmulas estabelecidas, tanto comerciais quanto comportamentais, buscando novas maneiras de se “ver” o rock e a música no geral, os Strokes preferiram curtir o bom e velho rock n roll de sempre, e de uma maneira competentíssima e honesta, diga-se de passagem. Mas não há nada de novo nisso, nada de mau; e nada de salvador (ainda bem). E que se dane a salvação com prazo de validade.

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