Garagem: perdemos nosso melhor programa de rádio
Estou de luto. (…) Três anos após estrear na Brasil 2000, o melhor programa da rádio paulista (não posso falar brasileira por pura questão geográfica), o Garagem, chegou ao fim. Na verdade, lhe colocaram um ponto final. O capitalismo selvagem que cada vez toma mais conta do dial das FMs não deixa espaço para atrações como o Garagem.
Para quem não teve a oportunidade de conhecer, o Programa era o oposto do que se faz hoje nas chamadas rádios rock. Três jornalistas, conhecedores e críticos musicais tocavam o queriam, entrevistavam quem queriam e falavam mal de quem achavam que deviam. Eles não eram escravos das gravadoras e não tocavam nada parecido com o que se ouve por aí.
Tenho que confessar que minha dívida com este programa companheiro das noites e madrugadas de segunda-feira é enorme. Simplesmente ele me apresentou o Belle And Sebastian e os Strokes – para ficar nos mais importantes -, bandas que hoje habitam meu top 5 e top 20, respectivamente.
E não era apenas a música a grande atração. De vez em quando eles tocavam umas coisas eletrônicas chatas, mas o modo como o programa era apresentado o fazia único. Não havia normas, regrinhas, tudo era bem espontâneo, até despretensioso e, acima de tudo, o Garagem era extremamente engraçado. Cada semana tinha uma pergunta fictícia para os ouvintes darem suas respostas e concorrerem a prêmios. Os alvos preferidos eram figurinhas carimbadas da música, como Carlinhos Brown e Caetano Veloso, e as respostas eram de fazer uma boa piada do Casseta e Planeta parecer o momento mais sem graça da história da Rede Globo.
Os convidados sempre foram um caso a parte. Basicamente participavam dois tipos: Pessoas praticamente desconhecidas, cuja simplicidade, ingenuidade e produção bizarra rendiam muitas risadas. Nestes, grandes exemplos são o campeão de luta livre Trovão e a dupla de cantores populares Carlos Mendes e Jota C. Na outra vertente estavam pessoas com um currículo respeitável, como os apresentadores Fábio Massari e Gastão Moreira, e artistas que não têm lugar na vendida programação de nossas rádios.
Entre as bandas que lá se apresentaram, alguns momentos antológicos. Quem ouviu o Mudhoney mandando bala exclusivamente para o Garagem sabe do eu estou falando. O Superchunk com um acústico, a lenda do punk Buzzcocks e os criativos e loucos Trail Of Death nos deram mostras de suas produções com exclusividade através do finado programa.
Bianca Esperança
Dos ouvintes ilustres do Garagem, uma se destaca. É a garota Bianca, de Capivari. Certo dia, em 1999, ela ligou para o Programa e contou seu dilema. A menina reclamava que nos intervalos de sua escola só tocava pagode e axé, e ela queria ouvir rock, mas ninguém aceitava. O curioso é que Bianca tinha na época uns 7 anos apenas. Diante de fato tão especial, os caras colocaram ela no ar e armaram uma campanha, a “Bianca Esperança”. Algum tempo depois foi liberado o rock n roll na escola da garota e até aconteceu uma festa transmitida ao vivo no Programa, lá por volta da meia noite.
O universo do Garagem sempre foi cercado por personagens interessantes. O ouvinte Ari Robocop participou ao vivo várias vezes, sempre dando suas declarações bombásticas. Contribuindo cada um de seu modo, trabalharam na atração as atendentes “destemida” Verônica, “espetacular” Larissa e o “escravo” Gabriel. Todos foram devidamente motivos de dúvidas, enquetes e dilemas que cultivaram esse oceano músico-cultural que se chamava Garagem.
Momento histórico foi o programa em que teve como convidado o jornalista Marcelo Rezendo, atual apresentador do Repórter Cidadão, da Rede TV. Com um ambiente descontraído, Marcelo se mostrou bem diferente daquela pessoa dura da TV. Ele começou a contar seus casos jornalísticos e o programa fluiu de uma forma incrível. A certa altura os apresentadores tinham que interromper a conversa, tocar uma ou duas músicas e continuar as histórias em capítulos.
Com a saída do ar há cerca de dois anos dos locutores Tatola e Maia, que também estão marcados na história da Brasil 2000, o programa apresentado por Álvaro Pereira Júnior, André Barcinski e Paulo César Martin era o único que se destacava na rádio paulista. Infelizmente, o que vemos agora são atrações fechadas por todos os lados por esse bicho papão chamado IBOPE. Hoje em dia aquela pessoa que conhece música não é mais valorizada pelos empresários do meio. Estes, na verdade, vêem seu espaço como simples mercadoria a ser vendida a qualquer custo, de qualquer forma, para quem pagar melhor.
Curtas: Band News também é pop…
Alguns dias atrás estava vendo o canal Band News quando qual não foi minha surpresa ao ler a seguinte notícia: “A banda britânica Gene Loves Jezebel virá ao Brasil para três shows no final deste mês.” Isso foi dado naquela última faixa de notícias, que não é apresentada, apenas correm as últimas informações confirmadas. Não é demais? Em São Paulo é dia 28, no Directv Music Hall, antigo Palace. O “praticamente desconhecido por aqui” Gene Loves Jezebel é o detentor da música “Desire (Come And Get It)”, que vez ou outra toca nos programas de flash back das nossas queridas rádios. Para quem se interessar, vale a pena baixar “Love Keeps Dragging Me Down”, balada sensacional com presença obrigatória nos shows daqui.
… Mas não pode ser tudo certo
Eu gostaria de saber quem são os responsáveis pela parte de publicidade e assessoria de imprensa do show do Gene Loves Jezebel. Explico: foram colocados vários lamb-lambs pela cidade anunciando o show com “apenas” um erro: a grafia do nome da banda. Está lá, Gene Loves And Jezebel. O pior é que no folheto de atrações do mês da Ticketmaster, empresa detentora de um super monopólio na venda de ingressos em São Paulo, o grave engano foi repetido. Além dos responsáveis não entenderem nada da banda, também não têm noção da língua inglesa. Aportuguesando, esse erro seria algo como, ao invés de escrever Gil Ama Gisele, colocar Gil Ama E Gisele.