Fidelidade Alternativa: Saudades, esperanças e uma utopia
Quanto tempo nós teremos que esperar por isso? Por quanto tempo nós teremos que pagar por isso? Duas perguntas básicas para quem gosta e aguarda bons shows de rock aqui no Brasil. Dando continuidade a minha coluna passada, vou tratar aqui dos festivais que o tempo foi nos roubando, aos poucos, até nos encontrarmos na atual situação em se tratando de eventos musicais de qualidade.
As duas frases que abrem esta Fidelidade Alternativa foram tiradas (só trocando o pronome) do refrão de uma das melhores músicas do momento, “In My Place”, do Coldplay. Além de elas terem tudo a ver com nossa escassez de shows e atuais preços de ingressos, há outro forte motivo para as frases estarem aí. Semana passada, durante uma entrevista ao jornalista Lúcio Ribeiro, da Folha de São Paulo, Guy Berryman, baixista do Coldplay, declarou que sua banda vai tocar num tal de Rock In Rio, no Brasil. Quando será isso? Quanto isso custará ao público? Perguntas difíceis, e um pouco cruéis para quem fica esperando as respostas.
Essa ponta de esperança que inevitavelmente nos pega e corrói numa vontade incessante das suposições se confirmarem não me ilude muito. Diversas vezes já foram feitas declarações do tipo e no final tudo deu errado. Isso sem contar as promessas de começo de ano, fato já abordado por edições anteriores desta coluna. Claro que seria maravilhoso ter o Coldplay no Brasil, no auge da carreira, e ter o Rock In Rio ano que vem, mas na verdade, ao invés de termos confirmações e boas novidades, ultimamente temos sido bombardeados por cancelamentos e péssimas notícias.
O principal fato causador desse pessimismo é o cancelamento do Free Jazz Festival deste ano, que fatalmente teria o Radiohead em seu cast. O Festival recebeu seu tiro de misericórdia pelo alto preço do dólar, já que havia tido seu futuro selado pela lei que proíbe o patrocínio de marcas de cigarro (Souza Cruz). Uma pena. O Free Jazz nos deu muitas felicidades trazendo, só para ficar nas últimas edições, gente como Belle And Sebastian (inesquecível), Sonic Youth e Grandaddy. Mas não é só isso. Dando uma relembrada, alguns anos atrás nós tínhamos muito mais oportunidades de bons shows aqui no Brasil.
Quem não se lembra do Hollywood Rock? Festival super bacana que rolava em janeiro e trouxe, em 1993, a principal banda dos últimos quinze anos: o Nirvana. Nesta edição, além do estouradaço grupo de Kurt Cobain, vieram L7, Alice In Chains e Red Hot Chilli Peppers. Infelizmente em 96 o evento teve sua última edição, que não fez feio. Quem teve a oportunidade de ir ao Pacaembu na ocasião pôde conferir em três dias os dinossauros Page & Plant, os góticos do The Cure, os alternativos do Smashing Pumkins, além de várias outras atrações nacionais e internacionais.
Aqueles que gostam de um som mais pesado também já tiveram um festival que lhes garantia boas atrações todo ano. Era o Philips Monsters Of Rock, que ocorria no segundo semestre. Todos os “monstros” do heavy metal mundial passaram pelo festival. Black Sabbath, Iron Maiden, Kiss, Ozzy Osbourne, só para citar os maiores, tocaram em nosso país por meio do Monsters. Talvez a Philips descobriu, para tristeza de muitos, que o público metaleiro não é o maior consumidor de aparelhos eletrônicos.
Além desses festivais mais clássicos, outras opções também já nos rondaram. Da bebida, o Skol Rock fez um grande show com Bad Religion, Offspring e The Vandals, ensaiou uma edição com o amado Rage Against The Machine, mas encerrou suas atividades antes disso. Mais politicamente correto, da higiene pessoal, o Close Up Planet apresentou o camaleão David Bowie. É verdade que ele estava no pior momento de sua carreira – envolvido com a cena eletrônica -, mas é inegável sua importância na historia da música.
Voltando ao Rock In Rio, o empresário e idealizador Roberto Medina confirmou a ocorrência do evento ano que vem, mas, diferente das outras edições, esta não ocorrerá em janeiro. Medina deu três possibilidades para o Rock In Rio 4: 1ª e mais provável: o festival poderá ter uma edição um pouco menos grandiosa – o que aumenta a esperança de ver o Coldplay – , trazendo bandas internacionais de menor porte. 2ª e mais desejada: a ocorrência de um evento no mesmo molde dos outros três, ou seja, com atrações do porte de R.E.M., Queen, Neil Young e Guns n Roses. 3ª e completamente condenável: uma edição apenas com bandas nacionais. Isso mancharia o currículo super respeitado do Rock In Rio.
Dá pra imaginar um ano em que todos esses festivais se realizassem? No começo o Holywood Rock com o que há de mais quente no momento, depois o Rock In Rio com os grandes nomes do rock, os gigantes do heavy metal no Monsters, um pouco de punk no Skol, atrações mais pops no Close Up e alternativas no Free Jazz. Essa é uma utopia deliciosa, sem “tempo” para se concretizar, sem dinheiro que possa “pagar”.