Em primeira mão: o novo disco do Radiohead, faixa-a-faixa
Meses antes do lançamento oficial do disco da melhor banda de rock dos últimos 10 anos, esta coluna pôde ter acesso a todas as faixas originais que compõem Hail To The Thief. É preciso salientar, porém, que estes resumos abaixo correspondem a uma primeira impressão de cada música, já que fui escrevendo enquanto as ouvia.
Portanto, como só escutei o disco uma vez, fica difícil avaliar se “é tudo isso mesmo” o que dizem por aí – prefiro deixar esse tipo de conclusão para mais tarde. O fato é que o Radiohead não abandonou a eletrônica, porém de certa forma também não deixou de ser rock. É diferente de Kid A e Amnesiac, mas de nenhuma maneira deixa de lado seu legado, sua contribuição. OK Computer também está muito presente, apontando para o que muita gente já suspeitava: este disco é, mais uma vez, essencial.
2+2=5: Arranjos simples nos dois primeiros minutos, apenas um leve chimbau na marcação do ritmo – a melodia lembra The Tourist (OK Computer). Uma explosão de guitarras se sucede, algo meio Nirvana nos melhores dias. Thom Yorke se apresenta em um tom esquizofrênico, e a música acaba de repente, como se nos dissesse “você vai ter que ouvir outra vez”.
Sit Down. Stand Up.: Xilofone, piano, mais um chimbau programado e Yorke contido, formando um loop. Aos poucos, mais instrumentos vão entrando. A bateria é eletrônica, mas o clima ainda é OK Computer. De repente a coisa vira um drum n bass, um Idioteque mais rápido, envolvente, e a letra se repete como se viesse do Underworld.
Sail To The Moon: Mais um começo calmo com piano e guitarra limpa, clima um tanto espacial. A voz de Yorke parece ecoar, criando uma atmosfera a la Sigur Rós. Há uma quebra no final da música que deixa transparecer bastante o jeitão “perdido no espaço”. Faixa bem contemplativa.
Backdrifts: Experimental e minimalista, em princípio. A bateria volta a ser eletrônica, quebrada, aos modos da IDM. Yorke contrasta bem com a instrumentação, dando a impressão de ser a única coisa viva em meio a um quadro frio, pois a impressão sombria vai se intensificando ao longo da música. Logo um piano entra para dar um pouco mais de lirismo, e Yorke volta em dueto consigo mesmo. Os instantes finais voltam à obscuridade eletrônica do início.
Go To Sleep: Acústica, praticamente, algo como um Led Zeppelin pacífico. A levada também lembra Knives Out (Amnesiac) em certos momentos. Logo vai ficando mais raivosa, com a entrada de algumas guitarras mais sujas, configurando-se no que podemos chamar de a faixa mais “normal” até agora.
Where I End And You Begin: Começa com alguns efeitos “fantasmagóricos” e boa linha de baixo acompanhada de bateria (acústica), remetendo a I Might Be Wrong (Amnesiac). Os teclados analógicos dão charme e um bom toque de melancolia, enquanto uma guitarra discreta acompanha o ritmo. Há uma boa dose crescente de psicodelia que se dissipa no timing certo.
Suck Young Blood: Piano e baixo duelam tristemente. Yorke entra, não menos trágico, e as batidas de palmas preenchem o impressionante clima funerário da faixa. É um jazz suicida, um Chet Baker nas últimas. Não escute isso em um dia ruim ou assistindo às cenas da guerra. No terceiro minuto há um recomeço barulhento que culmina na seqüencia de palmas anteriormente citadas. É mesmo de arrepiar.
The Gloaming: Mais um início experimental e eletrônico, com baixo sub (bem grave), alguns efeitos rítmicos agudos e Yorke ecoando. Não há sinal de guitarras, pelo contrário, surgem mais efeitos hipnóticos no decorrer da música. A certa altura se parece com as últimas composições do Autechre. Definitivamente não há nada de rock nesta aqui, para desespero dos mais puristas.
There There: O começo se assemelha aos climas do Massive Attack, baixo bem destacado e bateria acústica modesta, sem usar bumbo ou caixa. A guitarra e Yorke vão fazendo seu papel, tentando dar mais cor a cada estrofe. Realmente é uma música atípica, apesar de simples, e acima de tudo envolvente. Por volta do quarto minuto a coisa pega de vez, conquistando o vigor ensaiado até então.
I Will: Mais uma de arrepiar: só uma guitarra limpa e Yorke em duas vozes, por vezes mais. Sabe aquele refrão de Lucky (OK Computer), “pull me out of the air crash”? É assim.
Punch Up At A Wedding: O começo é surpreendentemente funky, mas contido, intimista. O piano ajuda a marcar o ritmo e o resultado é uma composição realmente diferente no que se refere a Radiohead. Tem mais groove que o usual, dá até pra se arriscar numa dança a dois.
Myxamatosis: Estranha e cativante, mais uma pro time das experimentais que seguem a linha “nunca-fiz-algo-assim-antes”. Os teclados que entram ao longo da música dão um ótimo toque desesperador. A voz de Yorke passa por um vocoder e permanece grave, na medida do possível, lembrando passagens da banda Trans AM.
Scatterbrain: Faixa calma com instrumentação básica, bateria, baixo e uma guitarra. Parece ter saído de The Bends, mas ao mesmo tempo mostra-se madura, sem maiores problemas de desenvolvimento. A faixa mais convencional, junto com Go To Sleep.
A Wolf At The Door: A última música traz Yorke falando em cima de uma base lenta, quase um trip-hop, com comedido dedilhado de violão. Ela por vezes se transforma em algo esperançoso e tranqüilo, contrariando o encerramento dos últimos álbuns, notadamente obscuros. Sinal dos tempos?
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