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Coluna The Hall of Mirrors: os dez discos de 2002

Fim de ano, hora do tradicional balanço musical, com todo mundo dizendo quais foram suas composições preferidas, clipes, shows, etc. Provavelmente esta lista de dez discos estará incompleta, pois muitos dos lançamentos que eu gostaria de ter não chegaram às minhas mãos (o disco novo do Godspeed You Black Emperor!, por exemplo, que certamente estaria na relação abaixo). Porém, dentro daquilo que pude ouvir, posso enumerar álbuns que estão trazendo algo de novo e criativo – portanto esta seqüência definitivamente não será baseada na NME, como se costuma fazer por aí.


1. Sigur Rós – ()


Ágætis Byrjun foi uma surpresa para muita gente, mostrando jovens islandeses que misturavam seu ar gélido a uma rica sensibilidade não vista em lugar nenhum na música pop atual (a não ser sob um apelo piegas, como talvez o Coldplay faça). E agora, este álbum sem um nome representativo, com oito faixas também anônimas, merece levar o Sigur Rós ao posto de superbanda, não só por misturar o aparentemente simples space rock a climas notadamente épicos, eruditos até, mas principalmente por fazer com que qualquer ser humano dotado de coração fique arrepiado. Podem chamar de neo-progressivo, “viajante”, coisa e tal, mas o fato é que este disco faz qualquer outro da geração rock-MTV parecer brincadeira de criança.


2. The Flaming Lips – Yoshimi Battles The Pink Robots


Mais experimental que The Soft Bulletin, a veterana banda americana coloca sintetizadores analógicos a serviço do tradicional estilo psicodélico/contemplativo presente em sua discografia. Eu diria que se trata de um Abbey Road dos nossos tempos, com um toque mais robótico (e nem por isso menos emocional). É o tipo do disco que vai se tornando mais forte a cada audição e que possui vários singles em potencial.


3. Amon Tobin – Out From Out Where


Este é o álbum mais maduro de Amon Tobin até agora (e talvez também o mais dark), caindo bastante para o lado da IDM, se o compararmos às referências hip-hop/drum n bass de antes. A atmosfera criada é densa, bem provocativa e profundamente regada com efeitos de chorus, phasers e flangers. Se você quiser continuar tendo amigos convencionais e vida social ainda mais convencional, escute este disco sozinho, no escuro.


4. Boards Of Canada – Geogaddi


O segundo álbum dessa grande promessa da IDM foi lançado logo no começo do ano, mas isso não impediu o fato dele chegar em dezembro com a mesma força criativa. Em um ano em que os grandes nomes do gênero permaneceram em stand by, a dupla escocesa continuou a explorar sua melancolia gerada através de sintetizadores com o mesmo êxito de Music Has The Right To Children. É só ouvir as faixas Music Is Math, 1969, Dawn Chorus e Sunshine Record para ter certeza de que o disco é resultado de um belo processo de criação.


5. Primal Scream – Evil Heat


Pouca gente consegue juntar a agressividade do rock com a catarse da eletrônica de maneira convincente. E isso é o que acontece em Evil Heat, um disco eletrônico demais para roqueiros, e rock demais para a geração digital. Tudo o que for provocativo, nesse sentido, merece nossos parabéns. Highlights: Some Velvet Morning, sombria e urbanóide, Miss Lucifer, quase paranóica, e Detroit, nova trilha pra acelerar o carro numa auto-estrada.


6. Moby – 18


Eis um rapaz que não tem medo de ser pop e cult, ao mesmo tempo. Ainda tomando a fórmula de Play, Moby ainda usa samples de música negra, mesclando a um lado mais inocente e sensível, abusando de violinos e cadências harmônicas que vão e voltam. Disco simples e eficaz, servindo de background tanto para manhãs de domingo como para madrugadas de sábado.


7. Underworld – A Hundred Days Off


Mesmo não sendo mais o mesmo, Underworld ainda é altamente respeitável. Primeiro disco em muitos anos sem Darren Emerson, A Hundred Days Off se parece a um grande B-side de Dubnobasswithmyheadman (93). Se isso é uma desvantagem por parecer datado, pode se tornar um mérito para quem tinha saudades da sonoridade simples e envolvente do grupo. As faixas Two Months Off e Dinosaur Adventure 3D estão aí para não me deixar mentir sozinho.


8. The Notwist – Neon Golden


Outro disco lançado no começo do ano por este grupo indie alemão, que agora parece apostar no post-rock sob uma ótica mais minimalista, mas também contando com fortes influências de breakbeats. O vocal é tímido, perturbado, e os arranjos, introspectivos, dando a impressão de que seja uma espécie de revisitação à new wave. Grata surpresa.



9. Sonic Youth – Murray Street


Mais uma banda já antiga que recicla seu som e que não permanece estagnada no meio artístico, o Sonic Youth aproveita a vinda de Jim O Rourke para mostrar que o rock mudou de verdade. É claro que os arranjos de guitarra continuam se sobressaindo, mas em geral a raiva de outros tempos dá lugar a harmonias mais complexas e levadas quase hipnóticas.



10. Miss Kittin – On The Road


À parte de todo o hype que tomou conta da figura de Miss Kittin e do electro neste ano, o disco On The Road, de fevereiro, vem mostrar que ela é bem melhor mixando do que produzindo. O setlist conta com DJ Rush, Sven Vath, Umek, Laurent Garnier e Plaid, entre outros. Apesar de muitas faixas não representarem novidades em si (Elektrostatik, de Richie Hawtin, por exemplo), On The Road não deixa de ser uma feliz e obscura jornada.


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No Brasil


Enquanto isso, na nossa terra tivemos pelo menos dois lançamentos que merecem destaque. O primeiro veio tardiamente: a estréia de Fernanda Porto pela Trama, levando o drum n bass ao conservador mundo da MPB. O segundo é Nada Como Um Dia Após O Outro Dia, dos Racionais, que já não apresenta aquela incontida ousadia e revolta nas letras, mas que, mesmo assim, ainda representa a voz de um povo que carece de oportunidades e respeito por parte do nosso já inexistente Estado.


Merece destaque também a mobilização pela construção de um techno nacional, produzido aqui e até exportado. É só ver o caso de Pontapé, de Renato Cohen, que foi parar no último disco de Carl Cox.


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Ouça a rádio Hall Of Mirrors: http://hallofmirrors.cjb.net

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