O caso Facebook vs Power.com: os usuários precisam ser protegidos?
A partir da noite da última sexta-feira, vários sites e blogs de tecnologia em todo o mundo noticiaram que o Facebook havia registrado um processo contra a Power.com nos momentos finais de 2008. Nos comentários deixados nos sites que veicularam a informação, notei duas tendências: os usuários dos serviços, com perfil mais leigo e em número significantemente maior, em geral se mostraram “a favor” e já julgaram o processo como, no mínimo, controlador e hipócrita por parte do Facebook. Já os que demonstraram nos comentários serem desenvolvedores web ou “donos de site” se mostraram favoráveis à atitude da rede social, com declarações como “eu já sabia” ou “o que a power.com faz não é ético”.
No texto da ação judicial, o Facebook reclama de oito infrações supostamente cometidas pela Power.com, incluindo pormenores como “Uso não-autorizado da marca” , mas principalmente alegando que a Power praticou spam ao enviar convites para usuários em nome do Facebook, cometeu ato fraudulento (!!!) ao solicitar e armazenar informações de login de usuários, e violou os termos de uso da rede social ao coletar dados proprietários.
Não vou comentar a questão do spam, pois parece que nem a equipe de Mark Zuckerberg se deu ao trabalho de verificar o que realmente estava acontencendo e como acontecia. O cerne da disputa está nas duas práticas citadas por último.
A Power.com não cometeu ato fraudelento ao pedir senhas dos usuários do Facebook. A home-page do site deixava muito claro que se tratava de um serviço de valor agregado e que não tinha nenhuma associação com o Facebook, que por sua vez entrou nessa briga porque não quer permitir que seus usuários informem suas senhas em serviços de terceiros. Para eles, o usuário que o fizer, mesmo em sã consciência e por puro livre-arbítrio, viola os termos de uso da rede social.
E a coleta de dados proprietários? Pára tudo. Releia a pergunta. Que dados proprietários? O Facebook se limita a prestar um serviço que permite a usuários inserirem SEUS dados. Os termos de uso são um pouco confusos quanto a isso, mas diz lá que os usuários são responsáveis pelos seus dados E detém o copyright deles. Está na lei. Quem detém o copyright de algo, pode redistribuir, acessar ou permitir acesso de quem quiser, como quiser. E é essencialmente isso que um usuário do Facebook faz ao usar o Power.com. Permite que a Power.com acesse seus dados (listas de amigos, perfis, recados), e os exiba de uma forma que o usuário julga mais útil ou agradável.
O Facebook justifica a sua cruzada alegando que quer proteger a privacidade e segurança dos usuários. Diz que a Power deveria ter usado a API “Facebook Connect” para prestar seus serviços – o que vai efetivamente acontecer até o final deste mês, apesar de eu não ter certeza de quão contemplativo o Facebook Connect é em termos de acesso a funcionalidades que a Power fazia antes usando seus proxys.
Entendo perfeitamente que oferecer uma rede social de tamanha dimensão é custoso e não gera retorno proporcional, e que por isso a empresa que provê o serviço tem todo o direito de aplicar restrições de uso. Porém, ao se esconder por trás da bandeira do “estou protegendo você” para impedir que seus usuários usem suas senhas e acessem seus dados onde e como quiserem, o Facebook pode estar cometendo o mesmo erro que outras empresas e segmentos inteiros de mercado já comenteram em suas estratégias na internet: nadar contra a corrente, ir contra a vontade dos próprios clientes. A AOL fez isso com seus clientes ao dificultar o acesso a sites de terceiros e se deu mal. Toda a indústria musical lutou com todas as forças contra o MP3 quando ele surgiu, tratou consumidores como “piratas”, e como consequência hoje as grandes gravadoras são um negócio moribundo.
O Facebook, no momento a rede social mais usada no mundo, pode ter o mesmo destino se decidir continuar peitando sozinho a tendência do momento: a de uma web aberta, sem barreiras e com as aplicaçõescada vez mais integradas e sem limitações. O Facebook Connect e a plataforma de aplicativos podem dar a impressão de que a empresa abraça essa tendência, mas na verdade não são iniciativas boas o suficiente por esconderem motivações essencialmente contrárias a isso: a de confinar dentro de seu domínio os usuários do site.
Por esses motivos, acredito que esse processo não pode e não deve dar em nada, e que as empresas vão se acertar de algum jeito. Se isso acontecer, a história toda terá sido inclusive muito benéfica para a Power, que viu seu tráfego mais que duplicar nos últimos dias, certamente por efeito de toda a exposição obtida por conta do processo.
Porém, se o Facebook mantiver essa postura, tudo indica que vem aí mais um processo, desta vez contra o Meebo.com, que também está pedindo logins de usuários do site para oferecer um serviço mais completo de bate-papo com seus amigos na rede social. O Meebo, aliás, recebeu boa parte dos seus investimentos da mesma organização que injetou venture capital na Power.com, a Draper Fisher Juvertson.
Aguardemos o desenrolar dos fatos.
Tags: facebook, power.com, Redes Sociais-
allan